Saturday, February 05, 2005

A mota

Esta já tem barbas e, agora, ganha novos contornos, no meio deste caos humano de frustações, que é o divórcio.

Bom, já em 2003, o Filhote tinha um colega de escola que tirou a carta de mota e ... tinha a mota. Reparem que estamos a falar de um miúdo com, salvo erro, 14 anos. Concluindo eu que, nas devidas instâncias, ou sejam, as autoridades competentes, não se preocupam com qualquer apreciação da veracidade associada à justificação apresentada pelos pais, para que um puto de 14 anos tire a carta de mota, ates de atingir a idade legal para o efeito. Porque o miúdo morava mesmo ao lado da escola. Se calhar, o rapaz precisava da mota para levar o almoço à avó.

Claro está, o meu Filhote quis logo ter a sua mota, carta de condução e ... sei lá que mais. Manifestei-me contrário a essa aventura e, por certo, a Mãe, que já não falava comigo, também o terá sido. Seja como fôr, num daqueles dias em que resolveu pressionar-me mais com o assunto, fui tomado por uma desconfiança súbita e perguntei-lhe: “Então, vocês já deram umas voltinhas na mota desse gajo?”. “Já pai, lá na garagem dele”. Vai daí, começou a falar-me em cavalinhos e outras acrobacias. Aqui, comecei a ficar alarmado. Um pouco mais tarde, falei com a mãe de outro colega do Filhote, que me confirmou, também, haver lá em casa uma maior densidade de conversas sobre o assunto. Confidenciei-lhe o que o filhote me tinha contado, o que ela também já sabia.

Bom, a verdade é que fiquei a ruminar sobre o assunto. E lá tirei as minhas conclusões.
Admito que não quero que o filhote ande de mota. E que não tenha uma. Simplesmente, não acho que o espírito aventureiro, arrivista e exibicionista, próprio da idade, se submeta ao bom senso necessário para lidar com os perigos na estrada. E se é verdade que alguns miúdos demonstrem, prematuramente, a necessária maturidade, o meu Filhote não pertence a essa categoria. Depois, uma mota é mais um encargo financeiro que, nas horas de maior aperto, difícilmente seria suportável. O custo de aquisição, o combustível, o seguro e as reparações, entram nesta equação.

Só que ... há sempre uma “mas”. Ele pode não andar numa mota sua, mas pode andar nas dos outros. E o que sabe ele da estrada para sobreviver nela? Nada. Eu posso impedi-lo da andar na mota dos outros? Não! Ele vai andar, mesmo que o proiba? Sim! E vai mentir. Bom, se calhar, melhor seria que tirasse a carta, para conhecer mínimamente as regras de circulação.

Agora, se quiser uma mota, que a compre e a sustente com o dinheiro dele. Que trabalhe durante o verão, e saiba quanto custa arranjar uns míseros euros. Provávelmente terá, então, maior capacidade para considerar outras opções em que poderá gastar o dinheiro. Ficará a saber que, ou vai ao cinema e discotecas, já para não falar de outros festejos gastronómicos, ou gasta o dinheiro na gasolina, no seguro e nas reparações. Não sei como vai ser o futuro. Resta-me, como pai, suportar mais esta ansiedade, de saber que, a qualquer momento, algo de muito mau lhe poderá acontecer.

E há o reverso da medalha. Ele tem um sonho, um objectivo. Ficará a saber que, para o alcançar, terá de dedicar muito do seu tempo e esforço, a lidar com dificuldades e a ultrapassar obstáculos. No meio da derrocada do seu pequeno mundo, e da insegurança a que isso o submete, louvo este seu esforço e tenacidade, quiçá de fuga para a frente. Conta comigo. Agora, prepara-te porque, do ponto de vista financeiro, eu e a tua Mãe, com isto do divórcio, não te poderemos oferecer mais do que já tens. E acaba com essa tua insistência para que eu venda a casa o mais depressa possível. Ainda não sei como te demonstrar que isso não te fará mais rico e te ajudará a teres uma mota mais depressa. Nem a teres melhores amigos, se é que tens, para além de mim, mais algum. Resta-me dar-te a força necessária, e acompanhar-te neste teu projecto. Ao contrário do que fizeste com o computador, gostaria que, de vez em quando, me emprestasses a mota. Lamento que seja o raio de uma mota a ditar o rumo das coisas. Mas veremos no que dá.

4 Comments:

Blogger Karla said...

Tive conhecimento do teu blog agorinha mesmo, através do da Mãe Galinha. Não vou sequer fingir que te posso dar conselhos ou coisa assim - sou mãe recente de uma bebé de 9 meses. Mas li nas tuas palavras o vazio de um pai afastado dos filhos, e queria deixar-te uma palavra de apoio, porque dificilmente imagino algo pior.

Força!

7:23 PM  
Blogger Nuno said...

Não posso (não consigo) dizer nada para o (te?) confortar. Nem sequer para me conformar a mim. Sou, desde os meus 3 anos, filho de pais divorciados. Tenho 27. Não vou dizer que a minha vida foi fácil. Pode(s) imaginar que não. Divórcio litigioso. Segundos casamentos... enfim...
Fiquei com a minha mãe porque o mau da fita era só um. No meu caso, claro. A minha relação com o meu pai sempre foi estranha. Pelo menos para mim. Não há muita afinidade... Apesar de nos vermos regularmente (talvez não tanto quanto ele queira...).
Cheguei ao seu (teu) blog apenas carregando no botão "next blog", sou sincero...
Se for(es) ao meu blog, não estranhe(s)... é só o desgosto de Amor que me assola a alma de há 15 dias para cá.
Um abraço.

7:48 PM  
Blogger Nuno said...

pois... o endereço...
:P
nunoduarte.blogspot.com

7:50 PM  
Blogger Tão só, um Pai said...

... obrigado, amigos e amigas. É bom ter vocês assim tão perto.

2:08 PM  

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