Monday, February 07, 2005

Côr de Rosa

Compraram, cozeram e fiaram. Leram a cara da Mãe, como ciganas que lêm a sina, aquelas manchas não enganavam. Era côr de rosa, pois então. “Olhem que não”, advertia, que o sabia, porque o queria. Mas aquelas manchas na cara da Mãe, tudo diziam. Ah, e a barriga, tão redondinha? E a Lua, Santo Deus ...! “Olhem que não”, lá lhes dizia, já farto de feitiçarias. E as três, sorriam, como senhoras da verdade, senhoras da vida. Para me sossegar, lá foram bordando coisas em branco, e amarelo, “e azul ...?”, sim, também, sacrilégio do diabo que tudo ouvia. Elas, e a Mãe, todas contentes, fiavam, fiavam e eu, só via fitinhas, “...é pró cabelo!”,diziam, “... e o vestido?”, “ ... prá menina ...”, e a Mãe, fugindo com olhos, lá repetia, “Tanto me faz, seja o que for, vem do amor, por isso, que venha bem.”. E veio o dia, da próxima ecografia. “Aqui está a cara, ali a orelha, o nariz, tudo perfeitinho”. Eu bem olhava, dizia que sim, não lhe via a cara, a orelha não distinguia, mas que lá havia uma coisinha viva, havia. Olhei a Mãe, que me fitava, e lhe perguntou cheia de coragem: “É menino ou menina?”.”Ainda não sabem?”. “Pois não ...!”. “... seja o que fôr, que venha bem“. E ele, “... cois’e tal ... cois’e tal ... testículozinhos ... lindo menino ...”, no fim, todo eu sorria. Acompanhei a Mãe a casa da mãe. Que ao saber, meio zangada, magoada, “Vá-se embora, daqui não me leva nada!”, queriam estar sós, coisas de mãe e filha. Soube, depois, que Mãe chorou. Afinal, ela que tanto sofria, tivesse ao menos a felicidade do que queria. Depois, foi uma Mãe linda, com aquele filho que a nós vinha. Hoje me rio, com tão pequeninos pedaços, deste doce chocolatinho na minha vida.
Primavera ou início do Verão de 1989.

Hoje sorri. Segunda, 7 de Fevereiro de 2005.

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