Friday, February 11, 2005

Junho

De 89. Muito quente. Nada tinha sido fácil. A Mãe, martirizada, 3 meses em casa, gravidez de risco, hipertensão. Chorava, muito, deprimida, da solidão. A médica pô-la de baixa, sem autorização para sair de casa. Por azar, nos dois dias em que saíu, um dos quais para a consulta, apareceu o fiscal da segurança social. Ficou tão aflita. Num dia, de manhã, vieram as águas. Como combinado, corri ao J, casal amigo, 6º C, guiou como um louco, até ao Dona Estefânia, Magalhães Coutinho, edifício arrepiante. Entrou. Voltou, entregou-me a roupa, ainda estava atrasado. A sua médica não viria, congressos, receei que a Mãe não fosse bem cuidada, era uma sexta-feira, quase sábado, do descanso, nós sabemos como são estas coisas no hospital. Entrou às 9 da manhã. Pela tarde, deixaram-me vê-la, sózinha, lençol em sangue, em desalento, assustada, Fiquei com ela. Veio-me à memória, lembrei-me do cordão. Era um domingo. A Mãe, sentiu um estremeção, disse, “ … tenho a sensação de que bébé sufoca no cordão”. Corremos para o hospital, o bébé estava bem. No agora, vieram médicos, mediram a dilatação. Podiam ter usado o sôro, mas haviam outras à frente, se calhar suas pacientes. Já noite, mediram-na outa vez, disseram, "vai para o parto, o bébé está em sofrimento". 9 e meia da noite. Estranhei, os outros choravam, o meu não, pareceu-me que miava, chamaram-me à sala, vi-o deitado, sobre o peito da mãe. Enquanto a cosiam, ela esboçou um sorriso, tirei-lhes uma foto, “posso pegar?”, “mas tem que ser rápido”. Aninhou-se, tão quentinho, mas logo mo levaram, “para observação”. No dia seguinte apareci para a visita, munido de flores, da família e de muitos amigos. Qual é a cama, não a encontravam. Por fim, disseram-me, "na sala de observações", por causa das costuras. Ao seu lado, outra mãe, que chorava a filha perdida. Do nosso filho, tinha ido vê-lo, estava a soro, estava bem, diziam-lhe. Por causa do cordão, ficara com a garganta ferida, a custo mamava, não chorava. Foi um choque, pediu-me para ir vê-lo, e fui. Bata por cima, entrei no berçário, indicaram-me um bébé rosado, de cabelo rapado e soro espetado, na cabeça, pois. Era tão bonito. Chorei. Quando me acalmei, voltei à Mãe, “é tão bonito”, disse-lhe que estava bem. Depois, foi a recuperação, da Mãe e do filho, até que se juntaram, finalmente, num quarto decente. E eu queixava-me, ao otorrino, “ele não chora …”. “Não se preocupe, dê-lhe um tempo, prepare os ouvidos ...”. No primeiro fim de semana em casa, foi um reboliço. Ora mamava, ora deixava, pouco dormia. A Mãe arreliava-se, com o próprio leite, recorremos aos suplementos, vieram os gases, prisão de ventre, ele chorava, ó se chorava. Quando adormecia, a Mãe dáva-mo, punha-o em cima da minha barriga, o calor aliviava-o. Depois, quando me virava, ele aninhava-se, como uma cobrinha, vinha, vinha, encostava-se ao meu corpo. Aprendi o que eram fraldas, biberões, esterilizações, fatinhos e camisinhas, dôres de costas e cantigas de embalar, pô-lo a arrotar.

Hoje, tive saudades. Quinta, 10 de Fevereiro de 2005

8 Comments:

Blogger Confessionário said...

Imagino as saudades. A criança precisava de ti. O que querias hoje era que ela precisasse de ti. Não será disso que tens saudades?
Agora imagina tu se ela não tivesse vindo ao mundo por causa de algum comodismo da parte de alguém ou se não tivessem feito tudo, tu, a mãe, os médicos, para ela viver?! Brigada pela visita lá ao confessionário. aparece sempre.

6:53 PM  
Blogger Nuno said...

Não penses, pelo meu último texto, que tenho filhos... nada disso.
Não tive essa possibilidade. Não cheguei tão longe.
O texto é ficção...
Mas espero vir a ter a(s) minha(s) oportunidade(s).

7:14 PM  
Blogger Tão só, um Pai said...

Padre, sabe, percebi que esta criança, já com 15 anos, precisa muito de mim, não dum pai omnipresente, que já não posso ser, mas dum modelo coerente, aberto, do conselheiro, do amigo e do confidente. Entre muitas, muitas outras coisas. Claro, eu também preciso muito dele.
Um abraço.

8:12 AM  
Blogger Tão só, um Pai said...

Nuno,
Se tiver que ser, seja. Mas sempre com felicidade. Até nos sacrifícios.
Grande abraço.

8:15 AM  
Blogger Tão só, um Pai said...

... obrigado, Ana, pelas palavras gentis.

12:13 PM  
Blogger Confessionário said...

Amigo pai, permite-me emendar: podes não ser um pai omnipresente fisicamente, mas por todos os outros meios podes... e já vi que o fazes! Força, amigo.

1:58 AM  
Blogger Tão só, um Pai said...

... obrigado, Padre, pelo regresso, e pela força que me é transmitida.

9:08 AM  
Anonymous Anonymous said...

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5:15 PM  

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