Sunday, March 16, 2008

E viva o "El niño" (bem lá de baixo, cá para cima ...)

Vai ... e vem, isto, o tempo dos tempos.




(20/03/08)



(2.1. ou seja, dois ponto um ponto) ... excepto no dia ...



... em que me vieste ao encontro, choroso, 3 aninhos de choraminguice, anuncias a decisão, de que te ias embora, "ai sim?, e para aonde?", "vou-me embora de casa". Baixaste os olhos, compreendo-te, uma parte de mim não achou piada, olhou-te fixamente de sobrolho carregado, enquanto a outra, num rasgado sorriso, continha uma gargalhada, deves ter ficado confuso. Já nem me lembro porque te desentendeste com a mãe. Por certo que, para ti, fora algo ou de muito inesperado, ou de muito doloroso, ou ambos, e "porquê, amor?", porque "Estou muito zangado com a mãe", ... tu?, zangado com a mãe?, com a tua rainha super-heroína, aquela que nunca largas, como um pinto sempre debaixo da galinha??! ... olááá...?!...
... será que tenho o rapaz avariado?, só pode, o rapaz não está a funcionar bem, era a primeira vez que te ouvia tal coisa, já para não falar dessa decisão, a de te ires embora, exigindo que o assunto fosse tratado com delicadeza, ou ainda lhe tomas o gosto. Onde foste buscar essa ideia de ires embora de casa?, por certo que nalgum desenho animado, tenho de perceber melhor o que andas a ver na televisão. Que diabo, eu fiado que só te zangavas comigo e, agora, isto. Sabes?, não está certo, viras os papéis cá de casa ao avesso, tiras-me o tapete debaixo dos pés, não estou nada confortável com o que se está a passar, ouviste, ó pequerrucho?. A custo e indeciso, de quando em vez levantando os olhos, estudando-me a reacção, lá explicaste as tuas razões, que até nem eram grande coisa, pois então, mas, pelo sim, pelo não, deixa-me apelar-te ao teu pequenino coração, isto tem que ser resolvido a bem, "se te fores embora, a mãe e o pai vão ficar muito, muito tristes, vamos chorar muito, não vás ... sabes, a mãe e o pai gostam muito de ti, mesmo quando ralham, eu sei que não acreditas, mas é verdade, eu gosto muito de ti e a mãe também". Enquanto ouvias, acenavas afirmativamente com a cabecinha, às tantas, a choraminguice, ora verdadeira, ora um nadinha fiteira, acalmou-se, apercebi-me duma luzinha, aí, dentro da cabecinha, ficaste indeciso, mas, logo te lembraste da zanga recente, vieram-te, de novo, as lagrimitas e a irredutível decisão de te ires embora de casa. Pois é, também querias que intercedesse junto da mãe, para ela não te deixar ou pedir-te para não ires, e, agora, assim, à distância, até calculo que, quando lho disseste, tenhas ouvido um calmo e desorientador "então, vai", mas não quiseste dar o braço a torcer. Como agora. Ainda por cima, não te estou a dar razão. Não posso, pá, não posso. "... depois, tu não tens a mãe, não tens o pai, à noite não tens uma casinha e uma caminha quentinha, pró frio e prá chuva (... azar, ainda estamos no verão ...), não tens os brinquedos, estás sózinho, não tens comidinhas,...", hum, pensaste mais um bocadinho, mas não, queres, mesmo, ir-te embora, e quando tivesses fome ias pedir comida ao senhor do café, pois, percebi, até, que já terias alguma fisgada quanto ao sítio para ficares, vizinhos conhecidos e amigos não te faltam, o filme está quase completo, dás-me um abraço de despedida, bolas, pá, isto não está certo, pior, ainda estás de pantufas e pijama, tenho de distrair-te, se te atrasar a partida, pode ser que a esqueças, "mas tens que fazer, primeiro, uma malinha, como o Marco, quando foi à procura da mãe ...", vê se percebes, o Marco anda pelo mundo à procura da mãe, não a fugir dela, e tu, não precisas de sair de casa para a encontrares, ela já cá está, pá, é só ires ali, à cozinha, e viv'á mãe, encontraste-a. Hum, o esforço foi bom, quanto ao resultado, esse é que não. Fui atrás dele até ao quarto onde, sem qualquer indecisão, agarrou no maior saco de pano que lá tinha, aliás, era o único, e encheu-o com uma dúzia dos brinquedos mais preciosos. "então, e roupa?, não levas?". Pergunta tola, "não quero", pois claro, os brinquedos estão primeiro. Bom, vamos tentar outra, "eu não acho que a mãe foi má para ti, mas se tu achas, porque não perdoas?", "ainda não perdôo à mãe", ainda?, então, ponderas vir a fazê-lo, já estás a recuar, estamos no bom caminho, alinho na tua aventura, a ver vamos se não será preciso terminá-la autoritariamente, se calhar, até o querias, tem paciência, vais ter que aprender a tua lição e dar o braço a torcer, "não te esqueças de dizer adeus à mãe", não se fez rogado, de saco às costas, um saco quase do seu tamanho, acena-lhe da porta da cozinha, "adeus mãe, adeus, ouviste, mãe?, vou embora, adeus, adeus ...". Sei que o foi, pungente e afectuosa, a despedida entre os dois, e amaldiçoo-me por não me encontrar com os detalhes na memória. Dá-me um abraço, "sabes?, nas escadas já é estar fora de casa", concordou, acenando afirmativamente com a cabecinha, "vou sentar aqui", e, de ar pesaroso, sentou-se no segundo degrau do patamar que ficava de frente para o elevador. Excelente, dali eu vejo-te. Não quis a porta aberta, mas aceitou que lhe deixasse a luz acesa. À vez, pelo óculo da porta, revezámo-nos em vigilância, eu, a mãe e, mais esporadicamente, a que seria a madrinha da filhota, não fosse ele tomar-se de coragem, apanhar o elevador, ou calcorrear a escadaria até ao rés do chão. É que, então, a pedagogia parental acabaria logo ali. Entretanto, os outros moradores do prédio, os que iam passando, ficavam-lhe a saber o que fazia e o porquê de estar ali. Nisso, não se poupava em palavras, sempre no seu ar trágico e pesaroso. À incredulidade inicial sucedia-se o sorriso que escondia a contenção das gargalhadas. De vez em quando, tinha que entreabrir a porta para mostrar que ele estava a ser vigiado. Por duas ou três vezes fui ter com ele, convidando-o a entrar, "não queres voltar a casa?, precisas de alguma coisa?". Com os olhos no chão, abanava a cabeça em negação. Às tantas, levantou-se, pegou na "trouxa", olhou para o elevador e, repentinamente, veio tocar à porta. Um,dois,três, quatro,cinco,seis ... nove, dez, agora sim, não vá ele pensar que estamos em pulgas, abri-lhe a porta, nem tempo houve para lhe perguntar seja o que for, exultando energicamente, anuncia, em alarido, a sua descoberta condescendente, "já não vou embora, pai, já não vou embora, eu já perdôo à mãe, já perdôo ... ", "que bom, que bom, dá um abraço ao pai, que bom ... vais dar um beijinho à mãe, vais?", sem pressas, dirige-se à cozinha, de onde lhe ouço, no mesmo tom de magnânima seriedade, "mãe, dá um beijinho, eu já não vou embora, eu já perdôo", "e eu também, meu filho ...", ouvi-o a ela, com quem troco um cúmplice sorriso no olhar. E lá vai ele para o quarto, fazer como a mãe ordenara, como se nada tivesse havido ... Este rapaz ... , enfim, até é um bandidozinho com piada ...




(19/03/08)

(1.1. lê-se um ponto um ponto, tá?) ... aniversários e festas.


Mais sextas, bem taralhocas.

Numa das últimas vezes, telefonam-me, claro, fora de horas, perguntando-me onde estava, se me tinha esquecido da festa lá em casa e que ainda me esperavam. Um pouco atordoado, ainda balbucio " ...há festa? Mas tu fazes anos?". Que sim, numa secura já ofendida. O sentimento de culpa, por tão grave esquecimento, arranca-me do torpor televisivo com que tentava dormir.
Desperto o esqueleto, sacudo-lhe o pó e, penosamente, transporto-o em penitência ao sítio aniversariante. Embora estranhando aquele silêncio, lá me desfiz em sentidas desculpas, no meio de felicitações e votos de muito bons e mais anos. Os de vida, claro. Os outros não se escrevem assim. O seu sorriso complacente e o abraço efusivo de agradecimento dizem-me que sou bem-vindo, o perdão foi-me concedido. Oiço vozes familiares na sala, que vou logo cumprimentar, percebendo, então, que ... esta coisa a que chamaram de "festa", o era a de três gatos pingados, à espera do quarto, para uma noite de cartas à kingalhada.

A tal "festa" já o ia no wisky que, por sorte, não era a zurrapa do "famoso faisão", cuja venda já deveria, há muito, ter sido proibida. Aproveito para me recompôr do logro sem perder a compustura, enquanto tento controlar um sentido e negativo impulso, associativo dos "convivas" a variações linguísticas com raiz na raça caprina, não excluindo outras que, de momento, o mínimo decoro me impedede de referir, quer por metáforas, quer por parábolas.

Ora bem. Ficou-me de lembrança a jogatina com um olho fechado e o outro aberto, a impossibilidade de memorizar seja o que for, as decisões de cartas tomadas por pressentimento, muita risota e a sensação estranha de pertença a uma seita de zombies, esperando o sol para se refugiarem em escuras catacumbas.


... Poizzzz'i-a-nôte foi quente e longa, o amanhecer estava lindo, não me lembro se almocei, apenas que dei por mim, outra vez, de noite, à procura dum torpor televisivo e a tentar adormecer. Haja pachorra, paz, amor e ... mais "aniversários" destes.

Há muito que a vida se tornou demasiado curta, sem "amanhãs", só os "hojes", arrastando os "ontens". Cá se fizeram, cá se recebem, ou em dádiva, ou em pagamento. Que o diga a dor de cabeça e a menos prosaica história de Pedro, o pastor, e do lobo, quando lobo o foi.




(18/03/08)


(3.nada) ... im-preparado

... "... não me sinto bem acolhida na tua casa. No verão, foste violento". ... o quê? ... fôôôgo ...! Percebo que cambaleio, sinto-me dorido e atordoado, um frio no estômago, quase tenho um vómito, sei que estas palavras não são dela, não fui violento, fui severo, quando vi que não comias e nem o querias fazer, sou pai, a tua vida é-me importante, é-me quase tudo, dei-te a conhecer e mostrei-te as conseqüências últimas dos teus actos, no teu crescimento e corpo de mulher, de como, no limite, te verias num hospital alimentada por tubos, ficaste assustada, vi-o nos teus olhos, também deves ter visto nos meus um desespero inaudível mas, agora, essas palavras, bolas, mal acolhida? tu?, tenho que me recuperar, respirar, não me deixar ir ao tapete, já vi que não será hoje que me irás explicar isso, insistes no mal acolhida sem me explicares por á + bê o como e o porquê, vamos ver outros assuntos, quero ouvir-te, não me interessa se as palavras são, ou não, tuas, há muito que não me contas e não te ouço nada, absolutamente nada, não tem só a ver com a idade, tem a ver com o afastamento, "há conversas que só posso falar com a mãe", certo, falar conversas, "quais?", "de mulheres", "por exemplo ...?", "coisas de mulheres, pai", pachorra, "o quê? de namoradinhos?", "não tenho, mas falamos de rapazes", "sobre isso, também podes falar comigo, não te esqueças de que sou rapaz, conheço bem o assunto", abordámos momentos da infância, rimos e sorrimos, recordaste-te das banhocas e das noites de histórias, mostraste-me algum sentimento de culpa, "não acho justo", disseste, ao eu andar, sempre, com os olhos postos em ti e não dar a mesma atenção ao teu irmão, "é verdade, na altura fui injusto, tu eras a minha menina, mas, contigo, aprendi e aprendo a ser, hoje, mais pai para ele e, também, foi com ele que aprendi a ser mais pai para ti", recuámos mais, até ao tempo em que não ocorrera, sequer, a decisão de termos um segundo filho, de a termos, voltámos ao presente, à minha zanga com o irmão, no verão, ao ela ocultar injustiças porque não quer ser o motivo dos meus conflictos com ele, era o que mais faltava, ao stress nas alturas dos testes, à choraminguice habitual nesses dias, porque se via aflita com o pouco tempo que tinha, pois andara a ver muita televisão, para não falar das horas a tagarelar nos "chats" da internet, e voltámos atrás, à insónia, à minha recusa em o admitir e tratar-me, porque alguém teria de estar disponível para um chamamento ou emergência nocturna, e disse-lho, "hoje, digas o que disseres, faria e farei o mesmo, e suportarei as conseqüências, sejam elas as que forem". A nossa anfitriã desculpou-se, tinha de dar a sessão por terminada, congratulou-nos pelo diálogo que, por ainda se encontrar inacabado, poderia ser continuado sem a sua presença, começando, agora, no regresso a casa, o que fizémos. Recuando, à ida, senti a filhota tensa, fui gracejando, arracando-lhe a custo um ou outro monossílabo. Até lhe ter perguntado pelos foguetes para o sinal luminoso que, desta vez, nem foram necessários. Só aí lhe vi um sorriso. No regresso a casa, a filhota fala pelos cotovelos, está solta e expansiva, como se a tivessem libertado dum peso que a trazia tolhida. Conta-me coisas de apalpões, de "pêgas" e outros comportamentos femininos que condena. Engoli em seco, se isto é uma amostra da tal "conversa de mulheres", onde ela já vai. Lembrei-me duma reunião com a directora de turma do irmão, quando ele tinha a mesma idade, confidenciando, ruborizada, serem elas as mais provocadoras e bem explícitas, quer nos desenhos, quer nos textos constantes dos papelinhos que interceptara. Pois bem, tens a boca seca, mas assume-te, tu és pai, "acho bem que, se não aprovas esses comportamentos, não os deves adoptar nem aceitar que outros os tenham contigo", mas, como tu és gajo, "deixa-me dizer-te, no entanto, que esse comportamento não te deve meter, assim, como tu o dizes, tanto nojo, porque, quando gostares de alguém, logo veremos como vocês se irão comportar", e eu não o veja, ou corro com o gajo à chicotada e interno-te num convento de freiras, murmurou o pai. A despedida foi-o à sua maneira, afectuosa, nos abraços bem apertados, que eu julgava, assim, tão cedo, não os voltar a ter, e beijos, longos, dos bem coladinhos à face, com que só ela me mima. Sim, é verdade, sou um pai demasiado mimado e os filhotes já me toparam este ponto fraco. Pois, "demasiado", para quem não os teve, assim, a estes mimos.


(17/03/08)

(2.nada) Nocturnos com transumâncias

Sexta. Fora de horas, à noite. A melodia taralhoca persiste. Inspiro fundo, instintivamente, bastante apreensivo. Sei que, apesar de já estarmos no fim-de-semana, se não fosse muito importante, desistiam.


Não desistem e, tanta persistência, também não é a dos taralhocos. Não é um bom presságio. A guinada peitoral ordena-me, que me tenha na frieza da serenidade. Seja, serenidade. Oiço-o tocar, bolso esquerdo do que está pendurado, no pequeno ecrã, "Filhos casa", mau, qual dos três será?, não percas tempo, respira fundo, sorri, agora sim,
"Olááá. Boooaaa noooite...!?".
Oiço fungar, um
"olá"
engasgado no pigarrear, e é ele. Chora. Preciso de desencalhá-lo, o tempo escasseia,
"... grande carraspana, pá, quando te constipaste?",
o fungáqá não pára,
"... não é isso ... ",
eu sei, vá, desembucha,
"... posso ir para aí?",
suspiro, afinal não houve nenhum acidente, nenhuma emergência, fisicamente estão bem, já estava no carro, volto para casa, para trás, uns segundos, péra lá, "aí"?, qual "aí"?, quando "aí"?,
"... aonde?",
"... pai, posso ir para a tua casa?",
olha que pergunta,
"... sim, claro, a que horas te vou buscar?",
percebo o que se passa, houve zanga, revejo e ajusto, mentalmente, os compromissos do dia seguinte, tenho de falar com a mãe,
"...pai, tem que ser agora, tenho que me ir embora, não quero estar aqui ...",
o quê?, tudo mal,
"Filho, tu e a mãe sempre se perdoaram, é claro que te vou buscar, mas gostava que se perdoassem",
"pai, a mãe perdoa-me, mas tenho que sair daqui, posso ir para ai?",
bolas, se não vieres para aqui, para onde irás a esta hora, nesta hora em que não te consegues perdoar a ti próprio, e me procuras?, de resto, ele irá reconciliar-se e voltar para a casa da mãe porque, comigo, estas zangas não duram mais do que um ou, no máximo, dois meses de afastamento, depois, é como se não tivesse havido nada, quando falar com a mãe explico-o,
"amôr, já estou a ir, desce quando estiveres pronto, até já ...",
mas, cá dentro, continua tudo mal, não quero que faças isso, pões tudo em causa, como da outra vez, viras-me as crenças do avesso e, embora isto fosse previsível, com a tua mãe é que não, comigo, ainda vá, estamos habituados, desde que eras pequerrucho, eu zangava-me, e logo tu, vermelho de contrariedade e indignação, ias para o colinho dela, serenava-te no sorriso da sua voz, chamava-te à razão, às vezes fazia-o a mim, no seu tom seco de ôgre, mas sempre foi o teu refúgio, excepto no dia ...


(16/03/08)

(1.nada) Sextas- ...

Sexta. Fora de horas, à noite. A melodia taralhoca persiste. Inspiro fundo, ora indeciso, ora apreensivo. Sei que, se não não fosse muito importante, desistiam.

Só assim não o é ao fim-de-semana, quando o meu pessoal, igualmente do mais taralhoco, com uns copos já mal medidos, entende que sou preciso. Para medir mais copos, para a galhofa, celebrarmos a alegria de estarmos vivos, de nos rirmos juntos. E assim ficamos até às ... bom, isso é algo que, agora, não interessa. De todo.

Regra geral, aceito o repto. Agarro nas minhas jolas sem alcool e lá me vou. No inicio, custou-lhes a aceitar que sobrevivesse alguém num estado de ... e, apenas, um pouco menos de sobriedade. Um pouco menos porque, na minha incapacidade de replicar o milagre da multiplicação, as jolas sem álcool também se acabam. Digamos que se trata dum estado de ... isso, "sobrieguez".
Em desespero, por tanta contenção, acusam-me de recusar os prazeres da vida. "Já não bebes, não fumas, ..." . Como não podia deixar de ser, baixando a voz, quase entre dentes para a miudagem não os ouvir, lá tentam a provocaçãozinha, quiçá, na esperança de que dê à língua, para me saberem mais, ou se cumpro com vida, "... já não (coisas e tal)...". Ora bem, ignore-se a insinuação e aplique-se a táctica número três, lembrando-os de que "Cada um tem a sua medida. Na minha, são duas de água para uma de alcool ...". Se a descrença já é muita e não tenho os filhotes ao pé, torno-me um pouco mais "pedagógico", há que criar-lhes expectativas e calá-los com a esperança , saia a táctica número ... não sei quantos, porque lhes perdi a conta, " ... não há azar, não perdem pela demora, já vos passo, ...".

Metodicamente, com calma e, de preferência, razoavelmente sóbrio.

Sunday, March 09, 2008

Bizarrias de "tim"

1. Olá
2. Olá
1. Quem és tu?
2. Não sou nada, sou a voz. E tu?
1. Outro nada, outra voz. Porquê?
2. Porque estás aqui.
1. Tu também.
2. Mas eu sei, porque sei, porque estou aqui.
1. Porquê?
2. Porque tu estás aqui.
1. Não entendo.
2. Foste tu que me procuraste.
>
>
>
>
2. ...se calhar, sou a tua solidão.
1. Prazer em conhecer-te. Não sabia que tinha uma. Tem dó.
2. Não sejas cínico.
1. Gozas, só pode. Como sabes que sou "um"?
2. Porque te conheço.
1. Fazes-me me rir.
2. E tu, também.
1. Não interessa. De que vamos falar?
2. De ti?
1. Não!
> Não, hoje não, hoje quero ouvir. Fala-me tu, de ti.
2.>
> vais achar que não faço sentido.
1. Fala.
2. Não gosto de mim.
1. És feia?
2. Às vezes, sim. Sinto-me só. Apetece-me fazer os outros infelizes.
1. Hoje, nem te atrevas a fazer-me isso.
> Estou a brincar.
> Vá, continua.
>
2. Também já te fiz infeliz.
1. E tu a dar-lhe.
> Seja, suponhamos que sim, que me conheces, que já me fizeste infeliz.
>
2. Essa hipótese não te perturba?
>
1. Veremos.
>
2. Pois.
1. Continua.
2. Também há pessoas que se sentem felizes comigo.
> Mas é sempre por pouco tempo.
>
>
>
>
1. E ...?
2. Também te fiz e faço, muitas vezes, feliz.
1. Duvido. Eu conheço muito bem quem, e o que me fez, e faz, feliz ou infeliz.
2. Vês? Também estás a repelir-me.
1. Se assim fosse, não estávamos aqui a falar.
2. Não é isso. Tu repeles-me porque não acreditas.
1. Acreditar? Ah, as minhas crenças ... És danada. Vá, vá! Isso, agora, não
> interessa. Afinal, estou a ouvir-te ... ou a ler-te... ou seja lá o que for ... ou
> não for ...
2. Ultimamente, tenho sentido a tua falta.
1. Ora essa ...
2. Já foste o meu amigo inseparável.
> Pela minha mão, exploraste a natureza selvagem, onde mais ninguém te
> acompanharia. Passeavas e percebeste o mundo comigo. Caçaste pássaros
> e pescaste comigo. Quando lias, assustavas-me. Enchias a mente de vozes
> e imagens. Cheguei a pensar que, prematuramente, me abandonavas. Nas
> vezes em que quase
>
2. quase te foste, eu fui tu e, tu, eu.
1. Espera ai, calma lá. E que tal se a malta mantivesse a conversa num nível
> menos exotérico?
2. Foste tu quem queria, quis e quer ouvir, em vez de falar.
1. Bolas, mas isso, era porque não queria falar de mim. Agora, tu, metes-me
> nessa história, a torto e a direito. É aborrecido, pá, é chato. Não sabes
> falar só de ti?
2 .Não, eu estou a falar de mim.
1. Hum ...
2. Reagiste mal ...
1. ... não ligues, é por causa dessas bizarrias de que falas ... desse constante
> "tim"... tu e mim, topas? tou cansado ...
2. ...ainda não tens sono?
1. ... ham ... porquê?
2. ... sou eu que te acompanho e te dou o teu silêncio, aquele de que
> precisas para te desligares do mundo, quando procuras adormecer...
>
1. ... és má ... muito má ...
2. ... também sou eu quem te faz escrever, e te dá os momentos para o
> fazeres.
1. ... então, ainda és muito mais má!
2. posso dormir ao teu lado?
1. >
1. pá, já nem digo nada
>
1. dorme onde quiseres
>
>
1. ao menos, tens uma cara bonita?
2. para sonhares? tenho todas as caras bonitas de que te possas lembrar
1. ham ...
> ham
> pois, lembrar ... de coisa nenhuma
>
> nao quero
>
> deves chamar- te
> -te escholtzia
2 >
2.?
>
2. dormes?
>
1. >
1. quase, não me fales
>
1. e não me toques
>
> senão, desperto
2. prometo
> dorme
> sim?
1. adeus, beijo
>
2. beijo
> boa noite
1.>
>
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> [Esc]

Tuesday, February 19, 2008

"...tolo..."

Dá-lhe para falar e, a mim, para rir. Ou, então, para ficar com um sorriso, ora apalermado, ora coisa nenhuma que palavra alguma o descreva. Coisas de pai-galinha.

Já fazia contas ao tempo, para minimizar o atraso ou, se possível, eliminá-lo. Tivera, até, o cuidado de, antes de sair de casa, lhe telefonar, "Amôr grande, vai descendo que o pai já está a ir para aí". A garota demorou 15 minutos a descer. Ou mais. Julguei que fosse, como habitualmente, por causa de algum carrapito que não tomava o jeito pretendido, ou a côr da camisola que não combinava com outra peça da indumentária. Esta malta pode levar uma eternidade, até que se sinta confortável com os trapitos escolhidos para sair à rua. No entanto, desta vez, não teria sido esse o motivo.

Entra-me no carro, esbaforida, de sorriso gaiato e feliz, beija-me de forma esfusiante. Está com muito bom aspecto e, rapidamente, sinto que, hoje, tenho a minha filha, mesmo que por breves instantes, de volta. Quase a rir, pergunto-lho, porque se demorou. Ainda com aquele sorriso de orelha a orelha, diz-me que esteve a acabar o trabalho de geografia. Desarmou-me. Se foi essa a razão, tem a quem sair. Se foi por causa duma conversa no "messenger", nunca o saberei. "Mas tu sabes que não podemos chegar atrasados". "É que tinha mesmo de acabar o trabalho". Mudo de rumo ao assunto e peço-lhe para me contar as coisas boas do fim-de-semana. A rapariga continua faladora e, ora me faz rir, ora sorrir.

Passo a portagem, olho para o relógio e percebo que tenho 12 minutos para chegar ao destino. Ela diz-me que dará um "soco nos dentinhos" de quem se puser à nossa frente. Com isso, tira-me uma gargalhada.
Continua a falar sobre tudo e eu, numa de galináceo, ora a sorrir, ora a rir. "Ó pai, pareces um tolo". "Hã? Êêê ...Êêêeuuu? ... Porquê? ", "Estás sempre a rir". "É porque me fazes rir", sorrio-lhe eu, enquanto finto o trânsito da auto-estrada a velocidades nada pedagógicas. Perante a visão, um pouco mais à frente, duma luzinha vermelha deveras antipática, desabafo, digo-lhe que, no dia em que o sinal luminoso, por que iremos passar, estiver verde, até deito um foguete. Ela sorri. O sinal muda para verde, quando nos aproximamos dele. Trocista, espreita-me e questiona, "Então, onde está o foguete?". "Pois ... ", desculpo-me e, meio engasgado, "fica para a próxima". Ainda tenho tempo para lhe dizer o que achei do último filme do Astérix e da comicidade do actor que encarnava o tal de Brutus. Quanto ao resto, não lhe achei grande piada.
Desafio-a para, o mais brevemente possível, irmos explorar um sushi. Deve ser a décima vez que lhe falo no assunto. Pergunta-me porque não vou com a minha amiga. "Porque quero ir com a minha filha. ", atalho.

Ora bolas, chegámos. Fim de conversa mas ... ainda estamos dentro do horário. Registamos a chegada e, uns minutos depois é a chamada. Cumprimento a psicóloga, saio e ... sorrio, agradecido e apreensivo. Tento ler um livro mas tenho de mudar de sala, para ignorar os comentários sarcásticos de um pai que já esperava há duas horas pela consulta de pediatria. Não deve, mesmo, estar habituado a estas coisas. Ainda por cima, num dia de temporal e de cheias. Ou, então, não sabe apresentar uma reclamação. Das primeiras vezes que lá fomos, aguardámos, também, duas horas. Tanto eu como a mãe sabemos que os bébés, febris ou não, sempre estiveram primeiro. Os nossos, também já o foram, bébés febris e garotos, daqueles muito ranhosinhos, que se nos agarram ferozmente à protecção do colo. Também sabemos que as pessoas erram e, por isso, deveremos estar atentos. Aquando da primeira consulta com a psicóloga, apercebemo-nos de que haveria um problema. Enquanto tentávamos esclarecer o assunto, a psicóloga fez o mesmo, depois de esperar meia hora sem que lhe fosse comunicada a nossa chegada. Nós, para além de descobrirmos que nem constávamos da lista de consultas, exigimos que se contactasse a médica. Esta, afinal, já estava ali, ao nosso lado, no mesmo balcão, pelo que se ultrapassou, de imediato, o problema.

Às tantas, o homem começa, jocosamente e sempre em alta voz, a desatinar, que se tratava do simplex a funcionar. Respirei fundo, saí dali.

Há malta assim, em todos os estratos sociais e de formação escolar ou académica. Atiram uns comentários em voz alta, sem destinatário específico, quiçá à espera duma ovação, ou apenas de alguma forma de atenção por parte dos outros presentes. Os piores são aqueles que, depois, se gabam junto dos amigos, de terem dito isto mais aquilo, e se vangloriam, como se tivessem ganho a grande causa das suas vidas, sem que, no fim, tenham atingido qualquer objectivo útil, ou resolvido o problema. Por falar em problema, esta malta deve ter problemas graves com o ego.

Não obstante o almofadado de uma fina camada de espuma, os bancos são quase de "suma-pau" e convidam-nos a darmos uns passos, a cada meia hora, para que as nádegas retomem a sua forma arredondada e se aliviem dos formigueiros da dormência. São quase seis da tarde e a minha filha continua lá dentro. Ainda bem. Pergunto-me o que, ou se, aos pais, será dado, em qualquer altura, algum retorno dessas conversas. Para mim, outra coisa não fará sentido. Claro está, se calhar, não pensamos todos da mesma maneira. Veremos.

Mudo de sítio, para facilitar o trabalho à equipa da limpeza, que o agradece. Absorvo-me no livro. Não dou pelo tempo e, de repente, tenho a filhota, ali mesmo ao lado, a perguntar-me, "então, vamos, pai?". Estava com um sorriso sereno e introspectivo. "Já foste ao guichet, por causa da justificação e saber se é preciso mais alguma coisa?". Sorriu, " não me digas que nem me viste...". Pois não. Enquanto percorríamos, de volta, os corredores labirínticos, diz-me que a psicóloga também acha que todos, os da família, incluindo o irmão, deveriam, também, recorrer a uma ajuda especializada, como ela o estava a ter. Percebo que, muito provavelmente e, assim, sem o devido contexto em que a conversa decorreu, aquelas palavras devam levar algum desconto. Ocorreu-me, por exemplo, que as mesmas tenham tido origem numa questão posta pela filhota, de forma directa, sobre o assunto. "...mas, como? Todos juntos?", "Não, cada um com o seu.", "...se ela o acha, assim, como tu o dizes, também o há-de recomendar ao pai e à mãe ...". Ocorreu-me, simplesmente, que nenhum terapeuta me ajudou a encontrar o, ou o meu caminho, para deixar de sentir ou aliviar-me do sentimento de perda causado pelo súbito afastamento dos filhos, nem do vazio que isso me deixou. Hoje, percebo que terei de conviver com esse vazio, até ao fim. Como algo que estará sempre presente, que fará, sempre, parte da vida. Há doenças que se curam, que o corpo cura. Mas, na vida, tal como no corpo, há coisas , mazelas, que não se curam. A vida não tem cura. Ponto final.

Sinto a filhota mais reconciliada consigo, com o mundo, comigo. Isso concede-me mais um momento de serenidade. Não obstante, tenho consciência de que estamos no início, de que nada está consolidado e o caminho ainda será longo. No regresso, comenta que a vida das senhoras da limpeza é difícil, ganham pouco e os horários raramente lhes permitirão ver a família. Dei-lhe razão, sugerindo-lhe que escrevesse sobre isso, e sobre outros pensamentos e reflexões, decorrentes da sua observação do mundo. Lembrei-me das muitas vezes em que eu e outros colegas as víamos chegar e partir sem irmos a casa. Como nós, muitos mais há e haviam, noutras vidas. Coisas da globalização e das profissões que, mesmo antes dela, sempre foram tramadas.
Finalmente, despede-se em beijinhos e abraços. Mas ... ainda não será desta que a terei de volta às visitas.

Chego a casa e a electricidade resolve ter descanso. Já de madrugada fizera o mesmo. Vou à janela e acho injusto que os bairros à volta continuem iluminados, indiferentes à escuridão vizinha. Paciência. Foi mais um dia, missão cumprida.

P.s.
Enquanto escrevia, alguém me telefonou, com a notícia da morte dum amigo. A vida não se lhe curou, o álcool não lhe perdoou, um cancro matou-o. A vida pode ser inebriante, se com ela formos honestamente sóbrios e ... nos deixarem, ou ajudarem a viver.

Monday, February 18, 2008

Agora, toma tu a bola.

Sorriu, não hesitou um segundo, "aproveita o momento, telefona-lhe já".


Andaram sem se falarem durante um tempos. Quando as coisas aquecem no tribunal, em casa, a visão e a justiça são unilaterais. A civilidade dá lugar ao insulto, digo-lhe adeus e afasto-me. Ficamos, assim, um mês ou dois. Depois, reencontramo-nos, eu tenho saudades, ele também, vemo-nos, abraçamo-nos.

O dia de aniversário marcou um novo reencontro. Foi o meu melhor dia de aniversário dos últimos 5 anos. Haviam cerca de 20 convidados. Para ser perfeito, só o seria com a presença física do meu pai e de mais 15 amigos e amigas do peito. Senti-lhes a falta, mas a casa e a minha capacidade de servir não dão para tanto.

À despedida pedi-lhe para me telefonar e combinarmos qualquer coisa. "Tu, agora, já andas, outra vez, ocupado. Telefona-me tu, quando tiveres tempo para mim". Fiquei estupefacto. Desde que completou os 18 anos, acabou unilateralmente com as visitas. Agora, achava que a existência de mais alguém se iria interpôr entre nós. Será que só o achou agora? No dia seguinte, confidenciei-o, a ela, o que ele me dissera. A sua resposta pronta fez-me pegar, de imediato, no telefone. Desde então, temo-nos visto e estado juntos mais vezes do que com a aplicação da regulação do poder paternal.

O que fazemos? Experimentamos comidas exóticas, vemos e discutimos filmes, bebemos um wiskyzinho, falamos de projectos e, quando ele o aborda, falamos da escola. Sim, é verdade, também falamos de mulheres e raparigas, de relações afectivas, de géneros musicais e concertos.

São momentos como estes que me fazem sentir que tudo valeu e valerá a pena. Depois deles, fica-me o sentimento de que, se morresse, o faria em paz, comigo e com o mundo.

Sunday, February 17, 2008

Compôr

... a vida, ao som do tempo. Tiram-se umas notas, muda-se a harmonia, melhora-se o tema central e procuramos não tocar, outra vez, a nota abandonada. Simplesmente, retiramo-la deste improviso, que é a vida. Tomam-se decisões e apagam-se melodias outrora cativantes mas que, posteriormente, até feriam o ouvido, de tão primitivas e cansativas. Repetitivas de estereótipos e fífias. Cacofonias.


Tomou o gosto por outras harmonias. Mais frescas, tocadas em novas escalas de mudanças. Embalou-se. Um dia, encontrou parceria, alguém que queria tocar na mesma harmonia. Depois, percebeu, a parceria já não queria, não aceitava a liberdade e o respeito pelo solo do outro, queria um dueto que tocasse, agora, por uma pauta, a por si escrita. Desfez-se o dueto em fífias agonizantes de feridas. Do que ficou gravado na memória auditiva da vida, do que tinha sobrado nos solos em harmonia, foi tudo apagado, no dia em que a incongruência das palavras, e a dos actos, excedeu, em acumulação de fífias, qualquer forma de harmonia.

Por tudo isto, foi o ano de 2007 um dos melhores das suas vidas. Partiram-se corações e destruíram-se omissões. Que 2008 lhes reserve igual verdade. Obrigado, 2007.

Thursday, February 14, 2008

Namoricos sem desgosto

de-Namoro
(Relembrado)




Quantos anos teria … cinco? … seis? Lembro-me de as ter comprado à entrada da estação, no Cais do Sodré.



Sempre detestei este dia, muito corrompido. Para mim, sempre fora o de 19 de Março, aquele em que tudo se iniciara, num suave, mas quente e longo beijo. Ah, mas este ano, todo eu transbordavade paixão. “… tenho de levar mais, afinal, são duas … e somos dois ...”. Saí mais cedo, a correr, " ... que se lixem os papéis, a mais os compromissos pseudo-inadiáveis ..."



Ah, este ano, o amor sorria-me. Caminhei, orgulhoso, de ramo farto, bonito, frondoso. No combóio todos me olhavam, sorrindo, tantos cuidados com aquele tesouro. Autocarro é que não, ficaria todo amachucado. Vamos de táxi, o que levo é precioso.



Combino com o Filho, “ … esta é para a tua namorada …. chchchchchch … , sim, a grande” (referia-me à mãe). Deixo que ele complete a sua oferenda com muitos beijinhos. Depois, entro eu, beijo a Mãe, já meio apardalada, reservo-lhe o ramo grande, “… um beijo, são para ti, meu amôr …”. A pequerrucha olhava, com um sorriso intrigado. Virei-me, ajoelhei-me, devagarinho, estendi-lhas, um raminho de três lindas rosinhas, declarei-me, “… para a minha namoradinha …”. Surpreendida, pegou nelas, trémula, e, de repente, desmoronou-se num pranto, num tal pranto, que me afligi. Abracei-a, peguei-lhe, embalei-a, “… o que foi, meu amôr … o que foi …?”. Ainda hoje, não sei, não sabemos, o que a fez ficar assim, naquele lindo dia, de namorados.

Este ano, como desde então, renovei os meus votos. "Olá, boa noite. Quero deixar um postal na caixa de correio para a Carolina. Não te importas de abrir a porta? " Que sim, concordou a mãe. Ontem, a filhota telefonou-me a agradecer o postal. Enfim, nada de mais singelo. Na capa, a imagem de três rosas com um pequenino texto, "Só três palavras importam... ". Lá dentro, ainda se lia ... "Gosto de ti... ".

Não, a filhota já não chora.

Wednesday, February 13, 2008

Terapias

Não entendeu bem o objectivo.

Primeiro, entrou a mãe. Depois, chamaram o pai. O sorriso da psicóloga desarmou-o.

Não se lembra de como se iniciou a conversa. Recorda-se de ter falado dos filhos, da doença da mãe, das opções que tomou para o melhor e para o pior, sempre temendo que a mãe voltasse a passar pelo mesmo. De como optou por calar os problemas, e sentir-se feliz por chegar a casa, a horas ilegíveis, e sentir que tinha valido a pena morrer mais um dia, ao contemplar o sono dos seus três anjos. De assumir que, em relação a isto, voltaria a fazer o mesmo e suportaria todas as consequências que já conhecia. De como conheceu a mãe. Do parto, para ele traumatizante, do primeiro filho. Dos desentendimentos parentais quanto à educação deste.

"E, depois, veio a menina .." , atalhou a psicóloga. Aí, falou, como alguns falam dos tempos da tropa. Pôs um sorriso e só se calou quando a moça lhe chamou a atenção para o adiantado da hora. Pois, ainda tinha de ouvir a filha. Quando saíu, ficou confuso. Que sentido tirar de tudo o que disse? Que aquela bébé e menina o viciou numa paternidade interrompida, incompleta, deixando-lhe um vazio irreparável no seu sentido de vida? Que o ensinou a lidar e perceber o seu papel na paternidade em relação ao irmão mais velho? E depois? Podemos atenuar ou curar doenças, mas não podemos curar a vida, não é?

Suspirou. Meu Deus, nada de mim fez ou faz sentido. O que sentirão os pais a quem raptam os filhos de 8 anos? Nada disto me faz, ainda, qualquer sentido. Continuava sem as respostas de que precisava para entender onde errara nos valores que, de forma consciente, ou não, transmitira à filha. Onde lhe falhara com a sua presença e com o diálogo, apesar da separação? Onde estavam as pontas desta meada tão ensarilhada? Onde devia deixar de ser pai? Ou onde deveria passar a ser outro pai, um pai diferente? Mas que pai? Porque não vem o irmão aqui? Ainda nas férias me insurgi contra a forma verbal com que tratava a irmã, que nem podia trautear a sua música preferida, porque o incomodava. Aliás, a pobre mal poda abrir a boca e exprimir a sua opinião. Com ele a querer, sempre, decidir pelos dois. E do receio dela em estar no centro dos conflictos entre mim e ele. E, se é assim comigo, que justiça impera na casa da mãe? O que reprime ela, para proteger a paz? Quais as fontes da sua insegurança? Quais os seus receios, hoje, em relação ao futuro? Como encaram eles uma nova relação dos pais com outros companheiros? Como o inicio de um abandono?

Ficou confuso e frustrado.

Tuesday, February 12, 2008

Sezões

O Carnaval foi bom. Visita a Tábua e seus arredores. Um sitio onde ele até gostaria de viver, fez-lhe lembrar a sua querida Moimenta e a barragem do Vilar. Só lhe falta o mar.

A companhia foi excelente. Sempre adorou a sobrevivência granítica das gentes beirãs. À ida, já ia febril. Nada que um cêgripe não tratasse. E a oportunidade da saída era boa demais para ser desperdiçada por causa duma febrezita imberbe. Mais a mais, o ar fresco da montanha, por vezes, tem o dom de curar tudo. Depois, era a tão almejada visita à Avó, planeada com cuidado e carinho. As netas, essas, há já uma semana que não falavam noutra coisa.

À segunda noite, percebeu que o milagre cêgripe não aconteceria. Sem problemas, preparou-se para a sua longa noite dos facas longas. Hábitos de sofrimentos e curas aprendidas com o paludismo e transpostos para as gripes europeias. Bom agasalho, febres na ordem dos 40 graus, dôres e mais dôres, qual lâminas de espadas cruelmente enterradas pela base da coluna, e por ela subindo, até trespassarem, o cérebro, dilacerando-o, indiferentes ao indescritível sofrimento. Seriam os delírios e ... paciência, os pesadelos. Sempre eles, oportunistas, aproveitando-se de todas as vulnerabilidades e prostração da fragilidade humana.
Quanto ao resto, pois lá viria uma noite gostosamente suada, com a febre exorcisada em cada espasmo de suor e dor. Certo de que, no dia seguinte, ele estaria livre das sezões e preparado para mais um dia, moído no corpo mas sorridente na alma. Pronto para se chegar à cozinha e dar mais dois dedos de conversa à Avó, enquanto planeavam e davam corpo à almoçarada, em jeito de desgarrada.
Mas ... os tempos são outros. Os vírus andam mais truculentos e difíceis de debelar. Estes, ao que parece, o seu corpo não os conhecia. Desta vez, nem uma pinga o suou. Depois duma segunda noite de tortura, atirou a toalha ás cordas e suplicou " leva-me ao hospital ". Viu-lhe o olhar assustado, o medo de reviver com ele o que passara com a mãe, no verão passado, quando acometida de súbito problema cardíaco.
Respirou fundo, guiou-o pelas consultas do centro de saúde, onde nem a medicação adicional nem as compressas, embebidas na gelada água dos canos, faziam baixar a febre. Ele tremia , rangia os dentes e tentava explicar-lhe a obcessiva falta de botões que tanto o irritaram nas mantas do seu último delírio. O RX acusava algo de suspeito, exigindo meios de diagnóstico adicionais para o confirmar, ou não, nos serviços de um hospital central. A pneumonia estava a tornar-se, este ano e por aquelas paragens, num problema crescente. "Aqui, não podemos fazer mais, vamos enviá-lo para Coimbra ". E fizeram-no. Mais análises, perguntas num sotaque doce, no das gentes locais, doce de simpatias e muito humanismo, contrastando com a aspereza e cínica ironia que testemunhara por várias vezes nos hospitais de Lisboa. Havia muita juventude diligente naquela equipa médica. Diagnóstico? O de surto gripal agudo, nada de pneumonias. Por enquanto. Um injectável para baixar a febre (" é o mesmo que aspergic ") e , milagres dos milagres, a febre começou a baixar e o corpo a suar em pinga. Finalmente, tinham-lhe devolvido o corpo, o seu corpo, a funcionar como o conhecera e conhecia, e funcionou como o sabia por mais dois dias. Gostosamente, suando e suado.
Ele sade que, como doente, não é sensato e pode, mesmo, tornar-se cínico e irritadiço, quando o sobrecarregam com mezinhas tradicionais ou lhe descarregam em cima recriminaçôes, quanto ao que fez ou deixou de fazer, pela saúde, ou contra ela. Lembra-se de, uma vez, na sua infância, ter sido açoitado enquanto sangrava abundantemente dum joelho. Numa altura em que estamos vulneráveis e frágeis, não suportamos ser, nessa altura, mentalmente açoitados, reagimos da pior maneira e nada mais desejamos do que sair porta fora, nos isolarmos e tratarmos-nos sózinhos. Como em tudo, a aprendizagem fez-se do passado, fez-se do presente, a dois, de forma solidária e indiferente aos perigos do contagio. Sem isolamentos, com amôr, assim, como ele tanto o gosta de escrever. Foi dura, prendeu-o à cama, prendeu-o à casa, saídas para tomar o café do vício, é que nem pensar , ou acaba-se já e aqui o namoro. Bolas, murmurou ele, entre dentes. Lá se fora a sua adorada e sagrada independência de eremita, o seu hábito de tudo fazer sózinho, incluindo os os descuidos na saúde. Soube-lhe bem, ter alguém que dele cuidou de forma responsável e diligente, sem se preocupar com mais nada. Quando se dão provas de estarmos em boas mãos, até o mais renitente se entrega.

Tuesday, January 29, 2008

Onde ficaste? Por onde estás? Como estás?

Não a viu nascer porque não o deixaram. Depois, não a largou.
Deu-lhe a ver e experimentar, nas mãos e boca, todos os pedacinhos de tudo, provava e comia de tudo, e tudo lhe dava, do que, e para onde, o seu dedinho indagador apontava. Para o Mundo. Comunicavam pelo silêncio, falavam-se pelo olhar. Um dia, o mundo dele ruíu e, com ele, o invisível cordão que os ligava. No entanto, algo nele continuou a senti-la, a percebê-la, num estado constante de asfixia, misto de muita perda e ternura.
Ela cresce, ele olha, sorri, angustia-se, percebe e não aceita que seja assim. Hoje, perde-a, todos os dias, bocadinho a bocadinho, em cada minuto, em cada segundo de afastamento.
Ela fecha-se, assim, de um dia para o outro, opta pela mãe, para estar. Afasta-o no Natal. Já não falam abertamente do que, para outros, seria tabu, no que respeita a conversas de pai e filha. Já não vai com ela às consultas de ginecologia, onde crivavam a médica com perguntas. Mas isso, até é normal. O pior, é o já não falarem de nada. Meia dúzia de banalidades, escondendo conflictos e acusações de um longo processo de separação, em que o bode expiatório será sempre o que não está lá. Ele. E ele percebeu que, apesar de só a ver umas parcas horas semanais, algo não estava bem nos seus hábitos alimentares. Modas da idade, disseram-lhe. No verão deu o alarme. Foi acusado de alarmista. Hoje, ela está nas consultas de psicologia. Por causa da anorexia.
Ele, é avisado, ou melhor, ordenado, pelo médico, de que não lhe pode causar pressões. Bem entendido, lá se foram as visitas ao pai. Que isso é importante para a cura. Será? Sente-se numa camisa de forças, quase a explodir. Está farto. Não está a aceitar o papel que lhe destinam, como "parte importante no processo de cura ", ou seja, o de mero espectador passivo, como lho reservam. Algo não lhe está bem nesse papel, que não lhe serve e onde não cabe. Precisa da sua mão. Em silêncio, para lhe sentir a alma. Senti-la na alma.

Monday, January 28, 2008

des-achada, a maninha pintainha.

Nunca mais se soube dela, por estas paragens.

Da última vez que lhe ouviu a voz ficaram, um e outro, sem saber bem o que dizerem ao telefone. Ele, porque não estava à espera de a ouvir, enquanto descia as escadas e recebia os convidados para a sua festa de aniversário. Reconheceu-lhe o silêncio cúmplice da infelicidade, de quando não está bem. Tentou, atabalhoadamente, balbuciar qualquer coisa com sentido, que a animasse, que a fizesse sorrir. Procurou, à pressa, uma graça perdida na memória, mas não a encontrou.

Em pouco tempo, desde que ela voltou a casar e encontrou um novo emprego, a distância aumentou. Foi sabendo, por terceiros, que lhe ia melhor a vida, não obstante os contratempos da nova união, normais para quem está de fora, mas angustiantes para quem os vive. Congratulou-se, ao saber que ambos conversaram, que a união voltara. Isso soube-o, então, por ela. Um dia, ligou-lhe, para saber como ia. Era dia de aniversário do filhote, foi convidado, conheceu-lhe mais familia, sentiu-a feliz, bem entregue, sentiu-se, ele, feliz.

Naquele preciso momento, não havia nada a dizer, por ficar tanto por dizer, para dizer. Por o desalento ser tão audível naquele silêncio, enquanto ele, ainda de telemóvel na mão, entre dois beijos e outros tantos abraços dos convivas recém-chegados, lutava para lhe dizer que não a achava bem, que talvez fosse bom visitá-la e à família, para conversarem, pensarem. Ela deu-lhe, laconicamente, os parabéns, após o que passou o telemóvel ao marido. Este, como sempre, muito contido e, simultâneamente, um pouco mais efusivo.

A vida, por momentos, é tão difícil, que perdemos a capacidade de sorrir.
O aniversariante sabia o que é e foi ter filhos com problemas de saúde. Ser pai, ou mãe, nunca foi algo para que estejamos preparados, nestas condições. As de sofrimento, ansiedade e sobressalto. Se a isso juntarmos a imatura e gratuita violência de terceiros, sobra a vontade de desancarmos o mundo.

Ainda não decorreu muito tempo mas, para ele, já o foi demais para não saber de mais nada. Talvez, por isso, tenha começado, também, por aqui, na esperança de uma pequena, mas pouco provável, visita.

Tuesday, January 08, 2008

"Porquê? Ainda não tinham reparado?"

Não sei como foi, ou o que foi. E o que é e como o é. Mas é.

Há muito que te conhecia, áspera, como ásperas são as mulheres que que se fazem à vida sózinhas e tomam nas suas mãos enormes responsabilidades. Eu sei que têm um lado implacável, sim, ele está lá. Nunca gostei de ser encostado à parede por uma mulher que, no espaço do relacionamento, se ache empoderada ou com o direito a dizer-me como quer a minha vida e o que devo ou não fazer, na maioria das vezes sem qualquer empatia pela delicadeza das situações. Suspeitei que fosses assim. Depois, comecei a ouvir-te, "O que achas?". E eu, não fazia ideia porque mo perguntavas. É que não achava nada de especial, ou ter algo a dizer, sobre o que conhecia ou desconhecia, sobre o que, para ti, seria a diferença e, para mim, não passavam de diferenças, assaz normais, de vida. Achei-te intrusiva, na tua forma de quereres o que de mim pretendias, sabendo que tinha mais alguém. Depois? O tempo passou, nem tudo na vida te correu de feição. Aliá, a mim, também não. Fomo-nos vendo, percebi que me respeitavas, no cuidado que punhas, na ternura das palavras. Percebi, ainda, que me observavas, me estudavas, e lá me ias perguntando, "o que achas?". Eu? Eu acho que o importante é Tu achares que as tuas Convicções são o importante e, mesmo que não concore com elas, aceito-as. E percebi que não concordavas com todas as minhas, com algumas, mas que as aceitavas. Ou melhor, que reservas para outro momento uma nova abordagem sobre o assunto. Foi nesta troca que, assim, subitamente, apercebi-me dum brilho diferente nos teus olhos. Não, não eram já aqueles olhos de aço, ordenando, por ser essa a tua vontade ou, quiçá, estares habituada a que a vida tivesse uma ordem, a que tu lhe punhas. Desta vez, olhei-te melhor, sim, eu olho as almas nos olhos. E vi na tua alma aquele brilho cintilante, a centelha da ternura. No dia de Natal, prendeste-me a atenção, foi a minha vez, observei-te, na pessoa diferente em que te tornaste, imaginativa, solitária exploradora, dos espaços e do tempo mas, simultâneamente, não querendo fazer sozinha a viagem da vida. Descobriste tanto e pergunto-me o que achaste de fazê-lo sem a partilha. Percebo-te. Desde miúdo que guardo comigo imagens que, de mim, fizeram o que sou, alguém cheio de coisas que não se partilham. Puseste-me a falar de coisas até esquecidas, daquelas que eu não queria. Ou julgava não o querer. Entraste de mansinho nesta vida. Sabendo, apenas, do passado que me conheces, ignorando todos os outros terramotos que me abalaram a vida, todos os dissabores e amarguras dos últimos, quase, 4 anos. Hum.. ou então, conhece-los, enquanto, pacientemente, aguardavas o meu regresso à "quase vida". Com os olhos postos no futuro. Como o dizes querer, para o futuro. No dia do Ano Novo, soube-me bem, o teu gesto terno, tão discreto, de despedida.
Ah, mas há que contar com a "criação". Três mulherzinhas que, de tolas, nada têm. Não demorou muito até nos surpreenderam numa beijoca escondida, perceberam que estavas diferente, e nós sabíamos, ia haver interrogatório. Comigo ausente, não se rogaram, "ó mãe, porque não nos disseste que gostavas dele? ". Na tua voz calma, na paz que hoje te conheço, limitaste-te a responder "Ah.... Porquê? Ainda não tinham reparado?"
Fim de interrogatório.

Thursday, September 20, 2007

Efémero

Naquela manhã, voltei ao mesmo sitio, o do encontro, sem outros olhares, que não os nossos. Fui, sentindo-te, sussurrando, doçuras, "... porque não nos sentamos?". Olhei para a mesa, ainda por limpar, sorri, comecei a sorrir. Sentei-me. Num café, nesta mesa, onde já não estou, porque olhei para a outra cadeira, não há lá ninguém, mas está mais alguém. Às vezes, a solidão prega-nos destas partidas. Algo que nos envolve, nos trás o peito apertado em ternuras, nos acompanha em doçuras, nunca estamos sós. Sorri. Percebi. Vi, em delicada ondulação, ténue, suave, transparências de vapôres aromáticos, suavemente erguendo-se, na chávena, da chávena, que respiro, aspiro, semicerrando os olhos, o teu rosto, definindo-se em contornos, formando-se com um sorriso, meio triste, mas meigo. Sorri. Olhei-te como o gosto de te olhar, por dentro, na alma, ou seja, nos teus olhos, sempre tristes, sempre meigos. Por vezes, tão aflitos. Outras, um nadinha cansados. Ah, mas sempre tão lindos. Suspirei. Arfei, de ternura. Que podia eu fazer, senão sorrir. Nos lábios, desenhaste um coração, igual ao gesto dum beijo, sereno e doce. Sonhei, desejei, beijei, também, muitas vezese, de olhos postos no que os outros viam, apenas, como um vazio, ou pouco mais, ou seja, do que ar e ...um ar de nadas. De forma estranha, delicadamente, tão delicadamente, gotinha a gotinha, bebi, com doçura, o meu café, saboroso, sem açúcar.
Decorrido algum tempo, voltei ao mesmo sítio, pedi ao balcão, já não esperei por alguém, fiquei com a vida, a minha, a fugir-me, sussurrando-me, " não tenhas medo, não da solidão, essa tua forma estranha de estares, quando pensam não estares, e sorris, ou te te ris, no meio de gente que não te sente, em nada, e em nada ficas, sempre, tão só ". Quando saí, pensei, estou comigo, já não te atendi, não te precisava, nessa voz das 9 às 5, com descanso aos dias santos. Lá está, sorri. Estava mesmo só. Estabeleci um plano, e sorri, outra vez, por cada omissão, fingimento, incumprimento ou a já indiferente desilusão, em cada inconsequente desconfirmação. Ah, estas amizades ... de despedidas ...ou bem que o são, ou não passam de outras e fingidas mentiras. Para ambos.

Wednesday, August 08, 2007

É verão, é verão ...

... e palpitam os corações.
Olhar posto no vazio, enquanto a fila na caixa se movia lentamente.
Quando chegou a tua vez, lá arranjaste um problema com o cartão de crédito. Não sabias o código.
Olhei-te, pela primeira vez, para quem estava na fila á minha frente. Para os pés, e a correiazinha de prata (ou prateada?) pendurada no tornozelo. Julgava que isso já tinha passado de moda.
Sorri.
Depois, olhaste-me, senti-me observado, olhei-te e ... desfiz-me. Será que respirei?
Ficámos nesse pasmo durante uns segundos. Nenhum de nós teve a coragem de convidar o outro para uma água, café ou o que fosse. Apenas sorrimos.
O rapaz da caixa, com um ar reprovador, quebrou o silêncio, esboçou-me um sorriso ciumento e estendeu-te o talão.
Puseste às costas a tenda de campismo, com a forma de uma mochila redonda, agarraste no saco com o resto das compras, e seguiste em frente.
Sim, reparei que paraste mais á frente, olhaste para trás, esperaste um pouco, viste-me a sair da caixa e a afastar-me de ti.
Desististe, saiste.
Desculpa, da última vez em que me senti assim, em que até as pernas me tremiam, apaixonei-me perdidamente.
E ... nem percebi bem quão nova serias, apesar do teu lindo corpo de mulher.
Para além disso, eras linda demais. Demais.

Tuesday, August 07, 2007

Em resumo, por 20 dias, um sorriso ...

Noc! Noc!

“Quem é?”

“Sou eu. Preciso de ajuda. Deixas-me entrar?”

“Sim, entra”.

“Dá-me o teu mimo, dá-me a tua sala, o único sinto em que, ainda, consigo dormir. Dá-me a tua companhia. É a única que não me deixa só”.

Deste-me a tua companhia, o brilho dos teus olhos, achei-os lindos, familiarmente felinos, quando brilharam no escuro. Tão felinos. Deste-me um sorriso, este o que tenho, quando penso neles. Deste-me a tua preocupação, o teu lindo sorriso, agora o teu, e o teu mimo. Perturbou-me a familiaridade de tudo o resto, em ti.

Sem dar por isso, porque já não o acreditava, senti-te na minha ternura. Que se tornou um pouco incontrolada. Desta vez, nem tive medo de a sentir, tanto e assim, por o ser por ti.

Vi-te, na mulher linda, a que és. Amei-te, sem preocupações de compatibilidades ou de sonhos de vida. Apenas e tão só por estar contigo, na tua companhia. Com ela, nunca me senti só e sei que, contigo, nunca me sentirei só.

Senti-te a falta, quando foste de férias. Já antes te sentia o desconforto, de estares e não estares. Preparei-me. Preparaste-me.

Depois, “... não dá” ... . Nem houve problema. Não deu, pronto. Mas ... nem doeu. Soube-me bem, o nem ter doído. Outra novidade, a juntar às surpresas mais agradáveis da vida.

Ficou-me a saudade do teu sorriso, do teu mimo, daquele brilho, e da tua companhia. Ficou-me este sorriso agradecido, talvez maroto, quando me lembro de ti. A gostar de ti. Um beijo. E um, sempre agradecido, “obrigado!”. Sim, por ter reaprendido a gostar de alguém. Simplesmente, já nem acreditava que isso voltasse a acontecer. Ainda bem que foi contigo, com a minha Amiga. Vá, outro beijo, como o quiseres, onde o quiseres. Ou sem beijo nenhum, se também não o quiseres. Não, não me dês abraços chegados e longos. Senão, sinto o teu peito, o teu cheiro, e a coisa entorna-se. Pois, é verdade, eu também tenho uma porta. E olha, não consigo deixar de sorrir, quando penso em ti.

Tuesday, June 05, 2007

... ou será ...? E .. se não?

Rio-me. Cá dentro. Às vezes, o riso escapa-se. Malandro. Fugiu-me um sorriso. De Gosto. Não fui o único. Deliciei-me nas contas desse rosário, nos astros procurado. Será que sim? Será que não? Ali diz que sim mas, a seguir, diz que não. Pois, que dúvida, será que sim? Ou será que não?
Acordei á hora esperada, preparei-me. Não, até lhes senti o frio, mas não tive visitas. As outras. Na tua casa, são coisa rara, estas visitas. Espreitei-te e sorrias ... sabias? Não quis fazer barulho, até o sol nascer. Tentei não acordar-te enquanto me despedia. Até nem queria ir lado nenhum. É que, ainda, muito sorrias. Sabias? .... Sorriso, de menina. Sorrio, pela forma como vives o drama, como mo explicas. É perturbante vê-lo, no teu brilho excitado de menina, algo em ti que não me é nada estranho. De o ver, também, no teu cabelo. Não o cortes. De que côr era o teu cabelo? Sorrio, por aquele brilho nos olhos, pela procura nos astros para uma razão, será que sim, será que não? Sorrio, pela tua dúvida intrigante, pela procura, pelo nadinha de perturbação. Ah, e se os astros não tivessem posto aquela dúvida ou aquela condição? E se, em vez desse e duvidante Se, ou daquele danado Mas ... só tivesse havido um Sim? Hummmm ... Acreditavas? Ou davas-nos o benefício da dúvida? Sorrio. Pelo estranho brilho, pela menina. Sorrio. Por ver o Tu, o lá de dentro, o da esfusiante e, às vezes, amedrontada Menina. Ontem, estavas com uma paz especial. Hoje, não sei que beijos te dar. Construí um rosário de beijos. Vêm directamente do produtor, não sei o que valem, há muito que não os faço, há muito que não os submeto à apreciação de alguém, dá-lhes tu um preço. Desde que te fiquem em conta ... faz-lhes tu o preço. Ah, e para os "arrepios" ... os do calafrio, há quem use mais calor. O do Sol, o da Vida. Sorrio.

Sunday, June 03, 2007

... mais cuidado, Pá!

Um gajo é criança. Deve ter 7 ou 8. Pelas minhas contas, mais para os 8. Apanha uma hepatite que só é diagnosticada 3 meses depois, porque apenas em Lourenço Marques o podem analisar e determinar. Um gajo está desidratado e desnutrido, já não se segura nas pernas e tem de ir apanhar sôro todos os dias ao hospital, porque até a água que engole vomita. Um gajo é miúdo, mas percebe e sabe. Sabe das minas que elevam o camião Berliet a não sei quantos metros no ar, com tudo o que vai lá dentro. O mais pequeno Unimog, esse vôa muito mais. Um jeep? Bem ... E a malta sabe que, lá dentro, vai carne e sangue. Sabe que, numa emboscada, ficam, ou fica, para sempre, um número indeterminado de gente. A malta houve a tropa, que desabafa os mêdos de terrores entre si. A malta ouve dissimulada, está calada para não darem por a gente estar a ouvir, ali. A malta precisa. Quer perceber o que está a acontecer. Não quer saber porquê. Porque eles são os maus e a nossa tropa os bons. A mãe suplica, para que venham eles a casa. Eles, recusam. Ela, recusa, aterrorizada, como se tivesse sido insultada: Jamais! Ele, Aqui Não Fica Internado. Trago-o Todos Os Dias e Volta Para Casa. A malta é criança, vai diariamente ao hospital durante um mês, para levar sôro. Ouve os helicópteros Alouete a aterrar a cada 5 minutos e vê o material descarregado a passar-lhe à frente. Gajos de verde a gritarem e a gemêrem, sempre sem braços e pernas, ou já calados. Um gajo aterroriza-se com o constante espectáculo de sangue. No hospital há sempre sangue, é sangue por todo o lado. Um gajo tenta distrair-se, conta-lhes os membros que faltam, ou os que restaram. Um gajo tem, sempre, que manter a cabeça ocupada. Com o que à frente tem. O sôro é lento. Dura, sempre, uma eternidade. Mas um gajo nunca percebeu porque passou aquele que estava cortado ao meio, separado abaixo do peito, até as tripas estavam separadas, penduradas e a balançar. A malta julgava que ali só entravam os que, ainda, podiam ter algum conserto, que os outros entravam pelo outro lado. Afinal, não, entravam todos pelo mesmo lado. Com franqueza, a malta é criança, vive no meio duma, tem de saber e já sabe o que é a guerra. Mas podiam ter tido mais cuidado. Depois de saber a lógica da entrada, a malta conta os calados e faz mais contas. Ao número de caixões enflorados no enterro diário, o que atravessa a cidade às 5 da tarde. Não o do mesmo dia, mas dois depois. A malta já aprendeu. Nunca são menos do que 10. Às vezes, são muitos mais, porque a "coisa" aqueceu. Um gajo julgava que esta malta "morrida" voltava à terra natal, à chamada "metrópole". Estes gajos não nasceram aqui e um gajo não percebe, se é mentira ou se não percebe nada do que é um enterro, se são enterrados ou desviados para outro transporte que vai dar ao avião. A malta não consegue comer um bife. Lembra-lhe carne e sangue. Prefere omeletes e ovos mexidos. Mas não pode, tem ou teve hepatite. A malta já não consegue ir aos pássaros. Já não há prazer em caçar. A malta é miúda, mas não dorme. À noite, fica alerta, à escuta, de ouvir os Alouete's, os que vão naquela direcção, tenta imaginar o que vai lá dentro. Faz contas, aos que vivem e aos que já não terão concerto. Quantos serão, depois, os do combóio florido, o das 5 da tarde. Dessas tardes em que não há brincadeiras de índios e "cowboys", nem de polícias e ladrões. A malta brinca aos comandos e "turras", finge que dispara, ou uma G3, ou uma bazooca. Brinca às armadilhas e emboscadas. Aos 11, a malta já acorda à noite, com falta de ar e o coração aos saltos. Só percebem aos 12. Durmam bem. Há malta que acha que sim, que não precisa, que nunca mais é dia, que a escola nunca mais vem. A malta lê. Dos 7 aos 11, lê tudo o que há para lêr. Já não gosta de palermices, já não gosta nem dos Cinco nem dos Sete. Atira-se a Hemingway, a Stefan Zweig, à Pearl Buck em histórias da China. A dezenas de outros, de que já não se lembra. A livros proibidos. O "4 ismos" não é proibido, mas o Pai foi chamado à Pide, porque não devia ser lido. O livro passou para a frente da estante, em lugar mais visível, para quem o quisesse lêr e vêr. A malta sonha o mundo, às vezes até às 4 da manhã. A malta desculpa-se, tem que acabar o livro. A malta já não toca piano. O piano já não toca com alegria. A malta já não toca no piano. Não lhe gosta a côr. É igual à dos caixões. A malta não suporta a côr castanho escura dos móveis. É igual à dos caixões. Não suporta as decorações com o vermelho na parêde. Vê sangue. Cheira a sangue. A malta tem terror de ir ao hospital. Tem mêdo de estar doente. Oculta a febre, a dôr de garganta. Os Pais reparam, olham-se em silêncio. Exigem que o médico muito ocupado com a tropa passe à visita em casa. Ele prefere o consultório, sem hora marcada. Os Pais não vergam. É em casa. 12 anos. Comunicam. Vamos embora para Portugal, voltamos daqui a um ano, para Lourenço Marques. A vida acabou-se, no fim da infância em Tete. A malta recusa. Não gosta da metrópole, só há frio, as pessoas são diferentes, são frias, nunca se pode sair de casa. A guerra tornou-se o nosso modo de vida, de loucura, tudo gira à volta dela. Aqui, somos livres, temos cão, esse leão da rodésia que dava pelo estranho nome de Japão, a gata Tomazina e a sua recente ninhada, os caminhos infindáveis a descobrir de bicleta, o sempre misterioso rio Zambeze, para onde a malta se retirava depois dos sábados da mocidade portuguesa. Aqui, apesar do ambimente de morte, havia, também, muita e muito mais vida. E mais chegava, no rebuliço de gentes diferentes, pela barragem de Cabora Bassa. Por causa de tudo. Por ser, afinal, a nossa cidade natal por adopção, com ou sem guerra. Por, apesar da guerra, ser ainda esta a nossa única memória da felicidade. Ficámos a saber que a Mãe estava muito doente, já não podia ser adiado. Anuímos e murmurámos um apressado Adeus. Sem lágrimas. Apenas coragem. Na minha alma, nunca mais consegui acolher outro enraízamento. Perdi-o para sempre.

... era escusado, Pá!

A malta até gosta de ser visitada, mas o que é demais chateia, pá. Aquela de dizeres Olha Só Pra Mim enquanto os gajos decidiam não percebia. Nunca ouvi um gajo a gritar assim, pá. Um gajo não quer ouvir, um gajo não quer ver, mas tu gritavas e gritavas Olha Práqui Olha Práqui até que percebi que era só para olhar nos olhos e não ver mais nada, pá. Mas um gajo não consegue, um gajo também grita, um gajo já tá todo mijado e borrado como tu. Um gajo grita um gajo grita para te segurar um gajo grita para agarrar o gajo que te vai dar mais uma antes de tu o saberes se é que ainda sentias alguma coisa um gajo grita para que não te tirarem mais nada mas os gajos não ouvem, pá, os gajos não querem ouvir e tu gritas Olha Práqui e um gajo olha-te nos olhos e grita mais ainda um gajo não aguenta um gajo grita para não ouvir um gajo já grita antes de ti um gajo quer apagar a luz e ir embora mas a luz não se apaga um gajo grita e os gajos não param pá! Um gajo grita e já não sai mais nada um gajo só tem ar pra gritar e não pára de gritar ar, pá! Um gajo já percebe que não querias que um gajo sentisse o que vai acontecer a seguir. Mas as coisas não são assim e um gajo grita para te segurar a ti e não sabe se ainda estás mas como ainda gritas mesmo com o sangue a sair-te da boca um gajo grita mais ainda porque vê que os gajos não param pá. Um gajo julgava que só iam dar umas chicotadas até ver os gajos a afiarem o material com material e a rirem-se pá. Um gajo vê, pá, um gajo tem perspectiva e tu já não consegues só olhar pra mim, pá. É lixado. Tás todo separado, pá. Os gajos estão lixados, atiram um pé pró pé mim. Os gajos brincam, andam à porrada com umas coisas que até parecem braços. Não dá pra perceber porque aquilo não tem mãos. E tu já pouco gritas. Só eu é que grito ar e dão-me com uma daquelas coisas na cara, pá, não se faz. Um gajo até percebe que nem tenham material de jeito práviar mas assim custa mais porque precisam de malhar mais para desfazer e separar. Já não vejo nada nos teus olhos, pá, e os gajos jogam à bola com a tua cabeça. É um desporto do caraças. E eu não quero acreditar, pá, não quero. Depois param e pôem-se no bula bula com as catanitas a apontar pra mim, mufana práqui, mufana práli, pá. Um gajo quer ir embora e apaga a luz. Já não precisa de estar neste filme, pá. Depois um gajo arde em febre de paludismo porque outro não soube fazer o trabalho bem feito, pá, ficou tudo por acabar, pá, esta malta é preguiçosa, pá. Não sabe trabalhar, não sabe acabar o trabalho que começa, pá. Agora, não tens que andar sempre a olhar e a gritar-me Olha Práqui. Pôrra, pá, passas a vida a olhar-me, pá. Não tens respeito, pá! Até me olhaste com o meu Pai um dia antes de ele morrer, pá! É que não tens respeito. És tu e o gajo do trabalho mal feito que se riu no fim, pá. É que não foi fim, pá. Esta malta não sabe trabalhar. E um gajo não quer tanta visita, pá. Não há respeito. Um gajo não precisa de andar com as mãos molhadas, pá, um gajo também sabe lavar as manatas, pá. Um gajo farta-se, com tanta visita, pá! Um gajo precisa de privacidade, pá! Isto é só um filme, pá, não pode ser mais nada,pá, não pode ser mais nada. Vai dormir, pá! A malta já percebeu que tem de fazer a vida a correr. A malta já percebeu que, agora, nunca mais o terá, muito mais tempo de vida! A malta sabe que vai ser amanhã ou depois. A malta sabe que vai ter uma vida muito mais curta, muito mais curta que a do dos outros. A malta tem de correr. Já não tem muito tempo. Nunca mais o terá. Mas a malta não tem que estar, sempre, a ser lembrada. Deixa-me em paz, pá! A malta, às vezes, também precisa de acordar, pá! Pôrra pra Ti!

Thursday, May 31, 2007

A Malta não brinca com a Vida, Pá!

Nunca me reconciliei com Ela. Acho, eu acho, que nunca o farei. Para mim, como a aprendi, nunca será uma partida, apenas a última forma do horror, do maior, entre os mais impensáeis horrores, perpretado pelo sadismo, crueldade, indiferença, e o ódio, acumulado, em gerações, todo concentrado, dessa raça, que se convencionou designar por humana. Vi-o, senti-o, aos 7, aos 8, aos 11, aos 14. E, aos 15, Ela agarrou-me, quis dar uns passos. Com a barbárie, com a frieza macabra, com aquele momento, que sabemos, depois não sabermos, do horror suplicante nos olhos e dos gritos de indescritível desespero e dôr, de mais horror, sempre o horror. De como o cheiro das fezes, da urina, e o adocicado do sangue se misturam, de comos trememos por termos os músculos todos retesados, para não sentirmos nada, para não sentirmos o impacto, de como cada milésimo de segundo já custa e queremos que tudo acabe já, e ali, de como nem já suportamos a espera e somos nós a querer tanto e com raiva encostamos a testa ao cano para lhe cheirar melhor o sangue e exigimos, suplicamos, ordenamos ainda com mais raiva Pôrra Acaba Essa Merda Filho Da Puta! Esta m custa! A malta julga que apaga as coisas, porque éramos miúdos, mas elas é que não se apagam. E, depois, nada. Duas semanas de cama, a arder, a arder. No hospital receitam quinino para o paludismo. Quando somos visitados, a malta percebe que não nos deixaram a vida, a malta foi deixada, a malta foi ficada, vazia de nada e de sentido, a malta não sabe onde fica, nem aqui, nem lá, em lado nenhum, nem aonde nem porquê, a malta tá aonde? A malta tá aqui, pá? Aqui o quê? E a malta precisa de vento nas fuças, para respirar, para tirar o sufoco, a malta precisa de correr, fora e dentro, a malta precisa de andar sempre a chamar o gajo e desafiar o mêdo, e, depois, anda sempre a encolher os ombros, até conseguir querer acreditar que está preparado para a próxima. Às vezes, não está. A malta precisa de vêr coisas bonitas, a malta precisa, sempre, de raiva, e tem raiva em tudo, a malta ama com raiva, a malta defende a vida com raiva. A malta, às vezes, tem Paz. A malta precisa de ter um sentido, ou nada fará, jamais, algum sentido. Não há outra forma de estar na vida, para se ter vida, pá. Os que amamos estão acima de tudo. Nunca perceberam? A malta já morreu e só queremos ver e dar vida, para sentir que está viva, pá! Olhá merda, pá! A malta não deve mexer nestas coisas. Já chega quando elas mexem em nós, pá. Pôrra pra Ela, pá. Esta merda é dura. A malta não dorme! A malta, um dia, deixou de dormir. Vou ali e venho já, Pá! Tá explicado, Pá? Deixem-me em Paz, Pá! A malta tem é que viver, Pá!

Wednesday, May 30, 2007

Recorrente

Preciso de vento. Não me interessam coordenadas, nem o que houver, ou haverá, para além de tão imenso e, sempre, o insondável, do horizonte. De manhã, aponta para a aurora, à tarde, para o poente e, à noite, apaixona-te, escolhe, das que vês, uma estrêla, só uma, mas uma que não seja cadente. O mar, há muito que não me assusta. É pena, devia merecer-me o mêdo. Só não percebo porque preciso, assim, tanto e de tanto vento. O leme? Leva-lo tu, eu quero a prôa, com ela afundar-me numa onda, a mais destruidora, a mais aterradora, quero ser arrastado, vês? nem me agarro ao casco, não tenho mêdo, mas eu queria, mesmo, sentir muito, mas muito mais mêdo. Que tormento. Porquê Eu? Não entendo, porque os levou a corrente e, a mim, soprou, assim, o vento. Já nem é um pesadêlo, tão só uma pergunta, Porquê Eu, Agora, ou Ainda, e só Eu, Aqui? Sinto-me febril, sinto-me demente, neste momento, sinto-me doente. Preciso de vêr, preciso de ser, preciso de muito, mas muito e mais vento.


Ermida, Peninha, Domingo, Meio-Dia.

Tuesday, May 29, 2007

Duetos

É preciso coragem para se tocar em dueto. Violino, acompanhado ao piano. Se a entrega, a sensibilidade ou a virtuosidade forem menores, o resultado é balofo, medonho e, até, desastroso, É preciso coragem. Não há nem a o cabo nem a rede de segurança proporcionado pela grande orquestra. Ali, dois músicos ou dão tudo o que têm de si, e excedem-se, ou o resultado é confrangedor. Quando assim acontecia, costumava-se, em tempos não muito idos, agradecer-lhes o insulto com ovos podres e tomates de validade há muito expirada. Hoje, educadamente aplaude-se, friamente, por mera cortesia. Neste último sábado, tive o prazer de assistir a momentos de excepção. Os de um dueto, de duendes em que a sensibilidade, o virtuosismo e a entrega se combinaram em momentos de verdadeiro êxtase e espanto. De suspender a respiração, agudos de brisas enebriadas que, num momento, se transformam em ventanias de tormentas, logo tudo se enfurecendo, rugindo e gritando sons que só os homens conhecem, crueldades e horrores perpetuados, a dôr e o sofrimento. Mozart, Brahms e Prokofiev. Para não mencionar os “encore”. Esses, ainda mal identificados.

Não sou, nem de perto, um musicólogo fervoroso. Não sou, sequer, ou de todo, um musicólogo. Aliás, nem faço ideia do que isso seja. Fiz um pouco de catequese, quero dizer, tive umas aulitas de piano quando era miúdo. Fui curioso, mais tarde estudei umas coisitas da teoria musical, para perceber porque alguns soam sempre ao mesmo e outros parecem uma estrada aberta, de infindáveis diálogos, estranhas dissonâncias de portas escancaradas, desafiando-nos à descoberta e à troca de interioridades, as nossas, as dos outros, com linguagens desconhecidas e viagens inesperadas. Nunca fui virtuoso ou erudito de coisa nenhuma, não o sou na escrita, no desporto, na pesca, na vela, no piano ou na raiva com que esgrimi o som mais distorcido da minha eléctrica guitarra. Uma barata Ibanez, comprada na Custódio Cardoso, castanha, com a forma duma Gibson SG. Como a desse louco, que deu pelo nome de Frank Zapa. Na música, sempre procurei muitas coisas. O divertimento, não o foi. Mas muito me diverti. Catarse? Talvez. E daí, não sei, a catarse é algo que se esgota muito rapidamente, e a música não pára de me compreender. Em ambientes, sons, ritmos, virtuosidades e, acima de tudo, a entrega da vida, sensibilidades. Não procuro a arte. Quando ela me encontra, por vezes, surpreendo-me. Outras vezes, não. Na “minha” música, não há muito disso, a arte da música. É mais algo, o caminhar na vida. Porque, na música, nunca me perdi. Sempre me reencontrei. Comigo e com os outros, a falar por mim, de mim, descobrindo-me onde eu não sabia que estava. Umas vezes perdido, outras escondido. De procuras inconstantes, num percurso amalgamado de labirintos e saídas. E sempre descobrindo os outros. Assustei-me? Sim, muitas vezes, e sempre sorrindo, agradecido. E quanta, a raiva. Mais esse, demasiado eterno. O tormento, constante, com que se carrega e amargura, a vida. Sorrio. “Não sou o único, A olhar o céu”. Nunca tive paz, nunca me senti em paz, a não ser por alguns e, sempre breves, instantes. Quando me revelo, em tormento. À música, à escrita, ou, simplesmente e, quantas as vezes, em silêncio. Mas, esta, a que tanto procuro, a Paz, só a doçura, só amando, só a terna entrega, num beijo, só ela me alivia, desse tormento. O que ouvi de Brahms e Prokofiev sempre estiveram cá dentro. A gritarem-me, também em tormento, do tormento. Gostosamente sofridas, as doçuras de Mozart. Sorrindo, pela angustiada ânsia de olhares, terna entrega de almas, naquele beijo, sem momento, sem tempo. DeVidas. DeMúsicas. DeDuetos. DeDuendes.

Sunday, May 27, 2007

Ontem

Ontem, tive um dia especial. Acompanhei o meu afilhado à primeira comunhão. Fui cumprimentado pelos meus filhos, que me olharam com aprovação. Cumprimentámo-nos, eu e a sua mãe, com o devido respeito e, também, alguma emoção. Os meus compadres e amigos cumprimentaram-me efusivamente, deixando tranparecer a comoção causada pela celebração. Assisti a um concerto de duetos que me surpreendeu e, por muitas vezes, até me tirou a respiração. Com a benção do brilho no olhar da minha filha, acompanhei e tive ao meu lado uma mulher, serena, adulta, sorridente e linda que, pura e simplesmente, o é, e estava um Espanto! É por tudo isto que me tenho na conta de pessoa e homem importante. É por tudo isto que as decisões e opções que tomei, tomo e tomarei na vida, mesmo aquelas que me vieram a causar dôr e sofrimento, foram e serão as que sempre considerei como importantes. Nisto, não me arrependo de nada e, nas mesmas circunstâncias, voltaria a fazer o mesmo mas, se pudesse, melhorando tudo com o que agora sei, nuns casos com as mesmas pessoas mas, noutros, talvez, com, e por outras mais importantes. Ou talvez não, talvez preferisse tê-as conhecido um nadinha mais tarde, se a vida mo deixasse. Só que, por muitas opções que tomemos, há coisas em que a vida nunca deixará que sejamos nós a escolher.

Friday, May 25, 2007

Gostava

... que acordassem com este meu sorriso, embevecido, feliz, por gostar de quem gosto, de ser quem sou, ter o que tenho, sonhar com o que amo, amar, e nada mais esperar da vida, do que a vida, vivida, com paixão, desgôsto, alegria ou solidão, mas vivida, com sofreguidão. Gostava, que acordassem, vivendo, desejando, não mais um dia, mas toda, longa ou curta, às vezes adorada, outra vezes temida, mas sempre, a vida.
Um beijo, um abraço, no que o aceitem e não o receiem, conforme o queiram, ou não.

Tuesday, May 22, 2007

Importante

Ou já o perceberam, ou um dia o perceberão.
No Amôr, o importante não é sermos amados, por quem e a quem muito o queremos, mas, tão só, amarmos muito, quem muito amamos, e sem esperamos, por eles, algum dia, sermos amados.

Monday, May 21, 2007

Himalaia

Quando subimos, à mais alta montanha, ao pico, ao Evereste do coração, quando estamos quase lá a chegar e, de repente nos largam a mão, tudo o resto se torna pequeno, mundano, ridículo, leviano, desprezivel, mesquinho, sujo de podridão. Olhamos, então, para o que, ainda e mais alto nos resta, o espaço, vazio, inalcançável, escuro, intrasponível, frio, um deserto de luzes no meio da vastidão, onde só encontramos, perdidos, a morte e a solidão. Mas, quando subimos à mais alta montanha e damos as mãos, sorrimos, olhamos, o êxtase, a beleza, o gosto, o sorriso, o rosto, o segrêdo, o amõr, o sabôr, a vida, o coração.

Sunday, May 20, 2007

Amôr sobre um B.I.

Nunca me senti, o quis sentir, nem ser "Paidrasto" de coisa alguma. Estes filhinhos a chamarem-me de "tio", era e ainda hoje o é, como ser socado no estômago, é um punhal que se crava, à frente e atrás, dum lado e do outro, onde nos fica a alma, ou se sente, às vezes, o pulsar dum punho cerrado onde temos o coração. Ouvi-la, a Eles, essa palavra era, pela lógica possível e associativa, irmanar-me ao verme mais asqueroso que se esconde no esgoto do que mais nojento o pior inferno tem. Mais grave, ainda, era a partilha, com esses verme, do meu primeiro nome. Porque mais não se pode amar, neste mais do que amor, de Pai, este sorriso, eterno, de eternamente embevecido, abracinhos e abracinhos, aconchegadados, aconchegadinhos, tão suavemente apertadinhos, de coração e coraçõeszinhos, festinhas, mais festinhas, tudo cheio de muitos, e tantos, mas tantos carinhos. E, no fim, de cada abracinho, esta angústia aflita até ao próximo olhar, até ao próximo abraçar de carinho. Como é doce a vida, quando estes queridinhos se lançam loucos, abrindo os abraçinhos, rasgando os olhos num sorriso, nos saltam gritando, loucos e entoando esse hino de alegria, essa palavra que nos derruba, por ser tão linda e, tão só, se resuminso às letrinhas "Pai!". Como queria que me chamassem "Pai!", sem recearem o roubo ou afastamento, nem as represálias e repreensões, os ciúmes ou mesquinhas invejas, sem os verbais maus-tratos de que seria alvo a Mãe, e sentissem, nestes afectos, o afecto de, apenas terem mais outro, por ser outro, que muito os ama, ardoroso Pai.

Naquele dia, sorri. queimei o BI no cinzeiro da minha repulsa, multou-me a polícia por morada incorrecta, mais essa grande falta, a de identidade incerta. Ainda e nessa tarde, deram-me mais um mês de vida, desejaram-me felicidades e disseram-me como se fazia, para trocar anos de vida por uma indemnização, por Judas recomendada. Sorri, ao ver a vida envolta num furacão. Depois, disse à Mãe, que chatice, vê lá que perdi o BI. Mais tardem fui ao registo, informei, roguei, extraviaram-me o BI e, porque me perdi, já agora, como posso mudar o nome deste vosso cidadão? Tudo escrevi no que me apontaram, de dificuldades, burocracias malditas, requerimentos repletos de palavras intransponíveis. Retorqui, expliquei tudo, de como me doía o "ti-ti", que me queria casar, casar todos os dias e se, em casando, o apelido se pode alterar, porque não, agora, também mudar o resto do meu nome, à medida da minha vida? Indagou-me, trocista. "Se vai mudar de nome, por curiosidade, como o queria?". Expliquei-lhe que, primeiro, acrescentaria o que sou e, se possível, conforme o requeria, retirar do topo o mais antigo para, agora, o reduzir ao que como o gostaria, que os mais novinhos, com toda a convicção e sem qualquer restrição, o chamassem em gritaria. "Como?", um pouco confusa, a senhora tentou entender-me no que lhe dizia, "Deixe-me ver se o percebo. Então, você, quer mudar o nome para Pai M(...)l ". Anuí com a cabeça e encolhi os ombros. Vi-lhe um sorriso lindo, tão bondoso, naquele rosto, outrora, tão fechado. "Fazemos assim. Para já, por causa da apreensão e pelo divórcio, renova o seu BI, ficando como está. Quando reunir a família, venha falar comigo, para vermos o que se pode fazer e como ficará". Agradeci, com um sorriso e um, muito esperançoso, obrigado. Há dias na vida em que tudo se Dá, tudo se derruba porque quem ama, se Dá, se Dá sempre, sem outro fim ou retribuição.

Hoje, na pedra do meu Pai, chorei pela minha perda, pedindo perdão por ter sucumbido ao desespero da vida e não ter cuidado de quem tanto amo, a quem confiei a minha vida, a essa luz e dádiva divina que me prometeu amôr, protecção para avida, disposta a esperar o tempo necessário para sermos uma família e a estar, sempre, ao meu lado, nos momentos mais difíceis. Perdoa-me por ter esquecido a tua sabedoria, corrido atrás dum vazio de medos e expectativas. Hoje, abracei o meu Pai, agradecendo por, na vida, me terem ficado e eu as amar, outras duas e maravilhosas criancinhas. E continuar a amar a Mãe, mesmo que me magoe e me diga Não. Obrigado, meu Pai, pelo teu perdão e o teu abraço, a este teu filho, tão precisado.

Friday, May 18, 2007

Náufrago

Maninha, estou aqui, como to prometi, faz algum tempo, aí. Quando não aguentar, vou chamar, vou gritar por ti. Contigo, meu amôr, a promessa não será quebrada. Diz-me, por favor, que não sofres com a minha mágoa. Não te encontro em lado nenhum e, agora, sofro eu, porque me preocupas tu. Diz-me que existes, logo te conto a minha viagem, de como a noite estava escura, a vaga me levou e nadei até á praia. O furacão, esse, ainda não acabou, mas outro dia passou. Amanhã, talvez encontre água. Tenho saudades duma lasanha, de contigo ir à praia, de dois dedos de conversa sobre tudo e sobre nada.

Procuro-te

Conheço-te e temo. Respeito-te. Conforto-me no teu olhar, onde só vejo o carinho e a côr do mar. Na tua companhia caridosa, consigo o milagre, o de escondêr a minha dôr. Não to disse, mas queria tanto o teu colo, o teu afago no meu cabelo, ouvindo o som dum longínquo encantamento. "When I need you". Dói-me, tanto, que tenha ficado por dançar. No Dia da Aparição, foi-me a dança prometida, mas logo esquecida. E Preciso, muito, do teu cuidado. Sabes? Sinto-me tão pobre, de tudo. Por troca, só tenho o ar que expiro, neste pedido desesperado. Leva-me, toma-me no teu colo, embala-me no teu carinho, sussura-me coisas lindas, das que fazem acreditar. Adormece-me e protege-me, enquanto estiver adormecido. Acalma-me nos pesadêlos mas, por favôr, não deixes de me afagar. E olha-me, sempre e assim, como se fosse mais um menino, daqueles de embalar.

Queda da Luz

Percebo, o teu refúgio nos óculos de sol. Mas, sabes, mesmo ao luar, estava lá o teu o olhar. Com tudo. Pois, os teus olhos, transparentes, também o são atrás dessas lentes. Queres e encenas uma frieza premeditada, para dar razão ao que não tem razão, e persegues ferozmente um caminho traçado para te calares no coração. Óculos de Sol. Sorrio, com pena. Sempre que nos abraçamos, vemos e tocamos, algo mais forte, do que eu e tu, ferozmente nos abana, nos arde e reclama. Não tem explicação. Não te preciso de dizer como isto se chama. Pois, essa coisa que arde mais do que uma chama. Foi assim, no sítio Queda da Luz, no Dia da Aparição ... e quando deixámos um Legado de ressureição .... Percebo, só te escondendo e longe de mim, consegues ser dona de ti. Percebo. É algo que muito queres até à exaustão, porque foi no desespero que procuraste a tua solução. É pena, essa frieza encenada e chamares-me de maldição. Mas, não percebo, se o querias, se o queres e me queres tão morto e enterrado, não deverias à parede ter-me encostado, no sítio da Queda da Luz. Podes soterrá-lo com betão ou alcatrão, podes correr e fugir, lançar-te nos braços e tapar-te desesperadametne com todos corpos deste mundo mas, acredita, já o fiz e desisti. Podias têr-mo pedido. Não interessa, eu faço-o, por ti. Sacrifício? Sim, ofereço-me, Dou-me. É mais um. Talvez seja o último, ou talvez não, por Eles, pequenos, também tão meus, sabes quem são. Pelo que lhes amo, por eles Dou-me, na promessa que te fiz, de aqui estar até ao fim. Caso te sobre uma réstea de coração, por favor, poupa, da tua ânsia, disso a que, friamente, até chamaste de decisão, aqueles, estes que me ficaram, aqui, no peito, tão dentro do coração. Agora, liberta-me do teu pesadêlo. Por paradoxo, mesmo sofrendo, sou menos infeliz. Gostava, ainda, de te esclarecer que, quando te pedi perdão, fi-lo por me deixar morrer e me faltarem as forças para te pedir a mão. Não pelo que choraste olhando, apenas, para o teu umbigo das mal-querenças, incertezas, dúvidas ou faltas de dedicação. Vá, não temas. Mata-me, de vez, e perder-me-às de ti, como to pedi. Mostra-me o pior do teu ódio, deixa-te de comiserações, vá, roga-me pragas de morte, fazendo de mim, no mínimo, um indiferente feliz. Quanto ao resto, sempre soube o que lá havia, quando discutimos condomínios e me barraste o caminho do acesso à tua morada. Curioso, na altura falaste de desarrumação. Depois, veio a confirmação. Hoje, chamas-lhe complicação. Que pena. Agora, nem isso interessa, porque sei que trabalhaste, desenhaste um sofrido e elaborado argumento, de provas, datas, factos e, como convém, sempre com a relevante omissão. Esforço louvável, sossegando a inconsciência da tua razão. Até quando? Sabes, eu não te merecia essa preocupação. Agradeço-ta à mesma, não poderia querer melhor prova de como me tens na estima e em elevada consideração. Ainda bem. Obrigado. Não te incomodes, eu respondo, Por Ti: Por Nada. Vês, Amôr? Deixo-te ir, daqui. Deixa-me ir, também, tu, meu Grande Coração.

Wednesday, May 16, 2007

Legado

Olho-te, em ternura, imensa e inexplicável, derrubando tudo, diques e muralhas, arrombando até portas muito antes invioláveis, e jorra, qual enxurrada, desaguando, agarrando, carinhosamente, a minha na tua mão. Sorrio-te. Palavras? Sorrio-te. Silêncio? Nem por isso. Quando o amôr ruge, a boca cala, o olhar grita, ri, asfixia, que sufoco, que aflição. Ah ... Paixão. Os que eram dois, foram. Agora, ficaram num.
Tomo-te, devagarinho, de carinho, nos meus braços. O tempo? Há muito fechei os olhos, sorrindo no teu rosto, no meu peito aninhado, perdido nesse afago, o que te aconchegou, e segurou, neste meu abraço. E beijo-te, o cabelo, um a um. Cuidadosamente, descubro nos meus dedos o delicado da tua face. É tão lindo, o teu cabelo, brincando, suavemente, entre os dedos do meu afago. Meu Deus, porque me és tão linda ...? Que injusto ...!

E quando te foge uma lágrima, na felicidade ou pela dôr, maior os cuidados, em que te seguro e consolo, bem ao meu jeito, bem junto do meu peito. Depois, sorvo em mais beijos, em cada uma o seu beijo, as pepitas que me vêm, tão preciosas e dolorosas, do fundo do amôr, que me dá o teu olhar. Ah, mas agora, quando nos virmos ou encontrarmos, o amar é silêncio, por segredo do momento, deste amor sempre terno, e não sei se eterno, mas sempre guardado, aqui e aí, num sôfrego olhar. Olha-me, sorri-me, como eu. Nos teus lábios lerei duas palavras. Duvido que alguém as reconheça. Eu murmuro mais uma, no total lerás três. É este o nosso legado. Nele, eu Amo-te e Adoro-te. Para Sempre.

Monday, May 14, 2007

Dar

Resumo: 13 de Maio de 2007


Primeiro, um grande encontrão. Paraste ali a minha asfixia, puseste-me a respirar. Pegaste no mais ruim daqui, nem percebo o que aproveitaste, engrandeceste-o e deste, deste, deste e mais deste, tanto. Lutaste contra todos os demónios, que não só os teus, sempre a Dar. Ao pé de ti, sou tão pequeno. E tu, és mesmo, mas mesmo muito Grande. Na minha agonia, pegaste na coragem, derrubaste muros, tiraste-me o coração, apertaste-o com força nas tuas mãos, socaste-o, abriste-o e não o largaste até ele jorrar. Nunca antes ele o fizera, assim. És Grande. Sorrio-te, és tão Grande. Como gosto de ti. Este Gostar está muito acima do Amar. De repente, mostraste-mo. É agarrar no que vem e se tem, multiplicá-lo por infinito e Dar, Dar e Dar. No amôr não há receber, só o Agarrar, no que vem. E, depois, Dar. E Dou, e quero Dar. Já nem tenho que Agarrar, de tanto me encheste do teu Dar. Sorrio-te, sorrio-me e, a sorrir, sei pelo que vale a pena lutar: por Dar. Não só o que não se Deu, como o que ficou por Dar. Até já. Ainda há muito por Dar.

Iniciado: Magoito, algures em Maio de 2007. Terminado: Lisboa, 13 de Maio de 2007.

Friday, May 11, 2007

Adôr

Olho-te, ...


... Adoro-te. Já não o consigo, calar-te, com o que te sinto, aqui. Amo-te, Adoro-te. Amar é muito pouco, no que te adoro, a ti. Sofro? Não, Morro, mas Adoro-te. Viver ou morrer é melhor, quando se pode morrer, assim. Abraço-te, Adoro-te. Choro? E depois? Desde que te adore tanto e ainda mais, até chegar ao fim. E Adoro-te, porque já não é Amôr, mas Adôr[o-te], isto, o que te tenho aqui. Adoro-te, assim, tanto, que até podes deitar fora, todo Adôr que esteja, a mais, para ti. Olho-te, Amo-te, Adoro-te. Beijo-te, Abraço-te e Adoro-te, e Beijo-te, mas beijo-te tanto, que a Deus um obrigado, por este Adôr tão forte, porque na dôr ou na morte, quando chegar o fim, vou sorrir, meu Amôr, com este Adôr, por ti. Amo-te e Adoro-te. Obrigado, por te Adorar assim.

Thursday, May 10, 2007

Mereces ...

... muito mais do que estas palavras. Pelo que respresentas e no que te amo, até quando, impensadamente, me magoas. Queria-te igualzinha à tua mãe, loirinha, achinezada, para beijar as duas em cada beijo que te dava. Quando nasceste, percebi que eras a minha menina, a tão desejada, mas não como te sonhara. Da tua mãe, só os olhos havia. Fiquei apaixonadíssimo pelas duas e ri-me pela fome que mostraste com o seio da loirinha. Pois, ela loirinha e tu, moreninha. Eras tão morena e chinezinha, parecias uma bruxinha, não mais te larguei, passaste a ser a minha linda, tão "linda bruxinha". Não tinhas nome, para além de "filhinha", em casa só me houviam "e a menina?". Hoje, até penso, será que é morena porque a mãe a desejou misturadinha? ... batoteira. Foi crescendo, primeiro pareceu-se com a avó materna, que andava toda babada. Depois, foi a cara da mãe mas, hoje, não lhe reconheço parecenças com mais ninguém. Agora, é só ela, a minha linda bruxinha com olho de amêndoa e bochechinha descaída. Nasceste há 13 anos, feitos hoje. Já andas com a mania de que não queres ser gorda. Cá para mim, anda mouro na costa. Se alguém te partir o coração, diz-me quem é que eu lhe parto a cara. O que sofreres, também o sofrerei, mas não te garanto que as tuas alegrias, tão só tuas, também as viverei. Porque algumas, eu já sei que as sofrerei. Um beijo do pai, que te ama tanto. Amo-te, amo-te, amo-te.

Wednesday, May 09, 2007

... Parabéns também para si, tia Carmo ... tia marafada ...

É claro que também tenho o direito a ter tias, ou não sabiam? Pois esta minha tia é terrivelmente impressionadissamente impressionante (conseguiram ler isto duma vez? ... possa ...). Vai nos 91 anos e não tem um único problema de ossos. É seca como uma dessas, já poucas, jovens jeitosas de 20 anos, anda tão direita que até parece ter engolido um cabide. E o andar ... oi, olhem aí, é "andar", mas com as perninhas, não é um apartamento, tá? Já se tavam a fazer ao cravanço ou a um aluguer mais em conta para as férias? Não percebem? Já o irão ... Pois, tem um andar ágil, assustadoramente ágil, até salta por cima das poças e deixa-me sem fôlego para a acompanhar na subida e descida de escadas. Ir às compras (em particular ao mercado) com ela, é um pesadelo estafante. Na praia, põe-nos a apanhar lapas durante horas, para um delicioso arroz à hora do jantar. E eu que julgava gostar muito de andar ...

Esta minha tiazinha é ... ... ... Algarvia, ... sua marafada! ... e quem não apanhou lapas, à hora do jantar tem uma peguntazinha, ali em frente a toda a gente: "Tão boas, não tão (nome do interlocutor/a), gostas? Mas não gostas de apanhá-las, pois não?" ... glup ... engasguei-me e acho que as lapas não me estão a cair bem ... Perdi o fio á meada ... ah, pois, isto a propósito das Mulheres Algarvias ... jeitosas, mas são tão jeitosas, são mesmo jeitosas, pá! ... uups, adiante, adiante, ó marafadas ... deixa-me ver, as de Coimbra também são de palitar os dentes no fim ... para tirar os os coisos pretos ... lá me perdi ... adiante ... as marafadas Mulheres Algarvias é que mandam em casa, e só se condescendem um pouco em ternuras quando o homem se revolta de vez em quando ... (ui, o que eu fui dizer, ui, ui, este ano não posso pôr o pézinho na minha amada Carrapateira, na minha amante Praia dos Mil Homens, nem beijar as pedras da calçada do Rogil ... ai, meu lindo Algarve ... ).

Apesar deste "defeito da mandonice" ... ou "particularidade cultural" (assim fica melhor, não é?), esta minha tia tocou-me fundo, ao explicar-se porque estava sempre hávida de uma pescaria nas mais recônditas falésias ou no meio dum mar sem terra á vista.

Amou e casou com um rapaz da Madeira, que lhe deu a volta ao juízo. Por artes e manhas, dizem que daquelas com bruxas á mistura e tudo, no fim, quem o pôs todo apanhado, foi ela. Também já me disseram que a rapariga era, então, uma febra e pêras ... compreendido. Claro, lá vieram as promessas de amor eterno, total dedicação à esposa amada e esse chorrilho de parvoeiras impensadas da prache com que se convencem as raparigas (hã? ... pá, já escrevi, não posso apagar ... tá bem, tá bem, mais depressa para disfarçar ...) a ficar ao nosso lado. ... a malta também chama, a isto, qualquer coisa do género "a canção do bandido" ... continuemos. No início do casamento, foram geograficamente separados por razões profissionais, mas lá se juntavam naqueles momentos em que, acabando-se os outros afazeres, podiam dedicar-se aos afectivos. Viveram tempos muito difíceis mas, quando um fraquejava, o outro dava-lhe a mão e, juntos, caminhavam. Quando ambos fraquejavam, paravam, abraçavam-se, retomavam o fôlego e, aos poucos, sempre aos poucos, renovavam a vida. Na altura, não haviam auto-estradas, o que permite aferir da afeição entre estes amantes. Ou então ... da mesma maneira que um homem não é de pau, uma mulher, também, não é de ferro ... e por aí adiante. Nunca lhes ouvi queixarem-se da solidão que essa situação lhes causou, ou o menor empenho na união que traçaram. Estiveream assim anos.
Finalmente, a vida permitiu-lhes "ajuntarem-se" em Faro. Mas, como cedo a minha tia descobriu, o malandro do marido tornara-se, entretanto, por aquela vida de quase solteiro, num terrivel viciado da pesca, coisa que não trazia da sua terra natal, antes o ganhara em terras algarvias, para não andar na bebida e acalmar a falta da sua amada. Com o que sempre se desculpava.
Por esta altura, à moça pôs-se o seguinte dilema: ou se divorciava e procurava outro, ou ficava abandonada. Depois de reflecttir seriamente sobre o assunto, optou por uma terceira via: para estar mais tempo com o marido, e se ele tinha aquele gosto tão grande, passaria ela a acompanhá-lo naquilo de que ele tanto gostava, a estarem os dois muito mais tempo juntos. É claro que, coisa rara para aquela altura, se ambos queriam almoçar e ter a casa arranjada, tinham que ambos vir mais cedo das pescarias para tratarem de si e das lides. Mas como vício é vício, coisa que se pega nas calmas e belas paisagens a cheiros do mar, passou o meu tio a ter que dissuadi-la de tanta pescaria, até porque já estava na altura de terem um filho e o raio da mulher não assentava.

Pois e ... conclusões? Que cada um tire a sua. Talvez que o amor para a vida, o genuíno, o que não se apregoa apenas da boca para fora e pelo qual estamos dispostos a ir até ao fim, não se deixa assustar pelas distâncias, pelos afastamanetos, nem impôe prazos. Acompanha-nos, sempre, no coração, porque nos preenche. Que é imune a situações materiais precárias e que, quando se está comprometido com o amor e em se fazer a vida a dois, nem as maiores angústias, dores ou doenças nos afastam. Não que nos torne a vida mais fácil mas, simplesmente, não se deixa assustar por ela.
Tive um amor assim que durou 15 anos. Em relação ao que vejo acontecer hoje, em termos relativos, até acho que durou uma vida. Consigo perceber que eu e a minha ex, mãe dos meus filhos, até conseguimos algo que muito poucos o conseguem com os actuais ritmos da vida. Não obstante as vicissitudes passadas e futuras do nosso relacionamento, depois de outra experiência recente, dou-lhe, agora, mais valor. Agradeço-lhe a coragem e uma capacidade de amar que nunca mais reencontrei. Pelo contrário, há cada vez mais e por aí, muita sordidez, tanta, e muita a desonestidade. Em que o "eu" vem primeiro que o "nós". Em que se ama e desama ao sabor dos objectivos pessoais e do facilitismo da vida, prevalecendo o desejo do gozo, a comodidade dos horários efemeramente compatíveis, a da proximidade dos lugares e a facilidade momentânea dos encontros. Em que se confunde companhia com amor. Em que se abandona o barco quando sobram as dificuldades e o futuro não se apresenta risonho. Em resumo, em que o amor leva o mesmo fim das coisas que, num momento se usam e, a seguir, se deitam fora. Fiquem bem.